Banquetes antigos

São menos freqüentes em nossos dias, os banquetes opiparos e atraentes dos saudosos tempos da centenária Diamantina. Mas é que a vida não era tão apertada como hoje.

Existia o braço escravo e as cozinheiras, escravas de confiança de seus senhores, eram mestras na arte culinária.

Por motivo de uma comemoração de bôdas, núpcias ou simples aniversário de casamento, de nascimento, etc., havia um banquete variado e regado pelos melhores vinhos que nos vinham diretamente de Portugal.

As escravas cozinheiras se esforçavam no tempero das iguarias, e o leitão assado, todo enfeitado de papel branco, rendado, e crivado de rodelas de limão azedo e azeitonas, enfiadas em palitos, constituía o regalo dos convidados. Travessas diversas de tutu de feijão com rodelas de lingüiça, frangos bem assados, carne verde, estufada, panela de arroz solto, coberto de cebola em rama, salsa, etc., predispunham os estômagos para a luta do garfo que o cheiroso molho atraía.

Começava, quase em silêncio, o ataque, e á medida que se esvaziavam os copos, rompiam as saudações, que elevavam aos cornos da lua, os festejados: noivos ou aniversariantes. Seguiam-se depois, com os semblantes rubros e alegres, os tradicionais coretos, bem entoados e a duetos.

Eram festas tão íntimas que se não reproduzirão jamais como naqueles tempos!

Os costumes era outros, reinava o acanhamento natural das moças, que se impunham ao respeito de educação que recebiam no lar.

Demais a mais, essa fruta rara, que é a sinceridade, não estava tão amorcêgada, como em nossos dias.

Afinal, para não me estender muito, transcrevo os tradicionais coretos, que era estrepitosos e harmoniosamente cantados no fim dos banquetes.

Duetos: Para nós que bela glória,

Se quereis acreditar;

Ao contento da vitória,

Nada mais a desejar!...

          Bis:        Vale mais que um diadema,

                        Em nossa fonte ornar!...

A dueto:

Bis:        Zum, zum, zum,

             Lá no meio do mar!...

 

              É o vento que nos atrasa,

              É o mar que nos atrapalha,

              Para no porto chegar !...

Bis:          Zum, zum, zum,

               Lá no meio do mar!...

         

               Os pastores desta aldeia,

               Já me fazem zombaria;

Bis:           Por me verem andor chorando:

                 Sem a tua, companhia.

         

                  Vejo um anjo do céu,

                  Com um cartão na mão;

                  O cartão dizia assim:

                  Viva a bela união.

Bis:              Como poderemos viver,

                   Sem a tua, sem a tua,

                   Sem a tua companhia.

 

                   Como pode o peixe vivo

                   Viver fora d’água fria.

Bis:               Como poderemos viver

                    Sem a tua, sem a tua,

                      Sem a tua companhia.

Também se cantava o “Ó divina Florentina, assim:

Ó divina Florentina,

Só de amor minh’alma ilumina;

Teu amante, delirante,

Da jornada, chegou neste instante,

Estribilho:

Chegou já, firuriruriu,

Firuriruriu,

O cantor, firuriruriu,

Com amor, firuriruriu,

Abre a porta formosa Leonora!

Afinal, ao tilintar dos copos cheios á mão, em saudações aos noivos, ou aos aniversariantes, rompiam, cantando um por sua vez, o “Agradecendo ao céu”.

E a resposta, também cantada, era esta:

“O prazer que nos deu!...”

Nota. – Quando o coretista canta: “Sem a tua companhia”, aponta com o dedo indicador  o homenegeado, no que é imitado por todos os cantores que participam do côro.” 

Dos antigos cantores dos coretos, reocordamos dos seguintes, todos já falecidos: Américo França, Elias Guerra, Augusto Teixeira Gentes (o Parentinho), Assis Moreira, Américo de Matos, Vicente Pacheco, José da Cunha Vale Laport, Raimundo Nonato da Silva, João Fernandes, Neco Coutinho, Antônio Efigênio de Sousa, (Paraguai), Pedro Fernandes, Vicente Torres, Joviano Vieira, João Ribeiro, Artur Queiroga, Américo Dias e outros.

Em nossos dias, nos jantares ou banquetes, só temos o Ernesto Roque, que sabe cantar com entusiasmo o antigo coreto. (Do livro inédito do Prof. J. A Neves), Voz de Dtna, 1949.