O Comendador Trindade

08-09-2013 12:47

 Vicente Trindade, a quem D. Pedro II concedeu o hábito de Cristo por ter mandado um escravo á Guerra do Paraguai, foi dos tipos mais interessantes de sua época, em Diamantina. Era negro, retinto. Não sabia ler. Experto e hábil mineiro, porém, conseguiu fortuna, explorando a lavra do Córrego do Ouro. Conta a tradição que, depois de Comendador, tornara-o a mania das grandezas: só queria viver em contacto com gente fidalga. Mandava cartas a Zacarias, a Cotegipe, á própria D. Izabel, e tratava por tu barão de Araçuaí, Serafim José de Menezes a quem chamava simplesmente - o Serafim. Três e quatro vezes por anos, oferecia aos amigos - a nobreza da terra - magníficos banquetes, a que não faltava os melhores vinhos de Portugal e da França, e nos quais, em mesas cobertas de cambraia alvíssima e baixelas de prata lavrada, eram servidas as iguarias mais finas, e não raro apareciam, nadando, vivos, em grandes vasos de cristal, lindos peixes dourados do Jequitinhonha, Certa vez, realizava-se um desses banquetes. Sentavam-se á mesa algumas das mais graduadas figuras da cidade.

                                               Imagem obtida do Google.

  A certa altura do jantar, quando já o efeito dos vinhos generosos se fazia sentir alteia voz o Comendador Trindade e chama um escravo: 

 " Ó Alexandre, vai a Claudio e dizer-lhe que mande a correspondência da Côrte; espero hoje cartas do Cotegipe!"

 Claudio era o agente do correio: Claudio Ribeiro de Almeida.

 Sai o escravo, em meio de geral estupefacção, e pouco depois de volta, a declarar que na agência não havia cartas para o sr. Comendador.

 "Não há cartas para mim? - Berra Trindade. Ora, uma coisa destas! Quem foi que disse que não há cartas para mim! Cartas de Zacarias, do Cotegipe, da Princesa?..."

 E sem poder conter, trovejante: 

 "Volte já a Claudio, grandesíssimo velhaco, e dizer-lhe que me mande cartas do Cotegipe..."

 E peremptório:

 "- quer haja, que não haja!..."

XIS, Diamantina, pág. 2, nº 66, Diamantina, 1929.