Diamantina 1899 a 1902

05-05-2011 10:11

    Procedente de Ouro Preto, chegou a Diamantina, em príncipios de 1899, a Companhia Dramatica Coimbra, assim constituída: Antonio Coimbra, diretor, Herminia, sua esposa; sofia, filha do do casal, seu marido Luiz Bitencourt; Agostinho e Pedro, secretário; Gustavo Marcandier, cenógrafo; João Gonçalves Lessa e sua esposa Leodegaria. Dispunha de luxuoso abundante guarda roupa, magníficos cenários e invejável equipamento.

    Permanecendo naquela cidade, quase um ano, esta excelente Companhia, só comparável á célebre de Boldrini e Correia, que ali estivesra em 1888, representou um vasto e variado repertório de dramas, óperas cômicas, comédias, duetos e operetas.

   Lembro-me ainda de uns versos da Chiquita.

    Opereta da Chiquita-Mariquita, imitação da Ópera Giroflê -Girofla:

    Flor de primor,

    Eu sou a Chiquita-Mariquita

    Que venho aqui saber

    O que me vai acontecer

    Tra-la-laú-tra-tra-trala-laú...

    Com dois nos braços,

    Com dois nos braços...

    Com dois nos braços...

    Não posso, não posso não!

    Não posso não!

    Muito aplaudido o Duo de los Paraguas (Dueto dos guarda chuvas) dançado e cantado por Sofia Bitencourt e Agostinha Pedra.

    Em 1899, o sábado de Aleluia caiu no dia 2 de abril. ao meio dia, após as solenidades da Sé, realizou-se na rua da Quitanda a queima de Judas. De uma corda estendida de uma janela a outra de uma casa em frente, pendia pelo pescoço o infeliz Iscariotess, de máscara, cartola e fraque, botinas de verniz, dançando, ás sacudidelas da corda, agitada; por dois sujeitos enquanto tocava uma valsa a banda de música do Corinho, sob a regência do maestro Paraguai (Antonio Efigênio de Souza).

    Em baixo, na rua, grande multidão de espectadores e a garotada a gritar provocações a diversas pessoas:

    - No lugar do Judas

    - João Colchão!

    - No lugar do Judas

    - Cordolino!

    - No lugar do Judas

    - Juca Urso!

    - No lugar do Judas

    - Manoel Petelica!

    Tudo isto entre os gritos e correrias da garotada, tentando apanhar na rua moedas de cobre, que eram atiradas de uma janela. Afinal acenderam um cigarro de polvora na boca do pobre judas, que ainda dançando, se incendiou, explodindo estrepitosamente, caindo ao chão, sendo seus restos fumigantes espatifados a pauladas, pela multidão em delírio.

    Nessa noite, de sábado para domingo, resolveram bater um castelo (serenata), com violão, flauta e cavaquinho, os alegres seresteiros: Emilio Leite, Odilon Queiroga, Zeca Mota, Julio Fonseca, Zeca Prado, Junius de Almeida, Joaquim Elias, Trajano, Carrinho Mota, acompanhando-os o barbeiro italiano Domingos d'Ascenzo.

    Percorreram diversas ruas da cidade, parando em frente ás casas de suas namoradas, entoando as modinhas da época:

    Bem sei, mulher, bem conheço

    Que fui um louco em amar-te!

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    Já vai fugindo de minh'ama a crença,

    Dentro em meu peito já não sinto amor!

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    Penso em ti

    Nestas horas de tristeza,

     Quando o sol no ocaso se conduz,

    E o mocho solitário adeja e pousa

    Nos braços carcomidos de uma cruz!

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    Quando começaram a cantar no Macau do Meio, em frente á casa do comerciante francês Alex Vial, que tinha uma filha, a Quita, requestada por um dos cantores, a janela de cima se abriu abrupatmente, aparecendo o negociante  a gritar furioso:

    - Seus vagabundos, é inútil essa cantoria! A preta cozinheira não está; dorme fora!

    O castelo continuou a percorrer as ruas, dissolvendo-se pela madrugada.

    O Odilon, filho do relojoeiro Antonio Augusto de Queiroga, era de estatura muito baixa, quase um anão. Andava namorando uma filha do negociante salusitiano Amancio da Rocha, delegado de polícia, temido pela rapaziada, por sua violência.

    Certo dia, passando o Odilon pela porta do snr. Salustiano, este o chamou:

    - Senhor Odilon!

    O rapaz aproximou-se, tremendo.

    - Encoste aqui na parede.    

    O Odilon obedeceu.

    O snr. Salustiano tirou do cavado colete um punhal. ( o pobre Odilon quase desmaiou.) Mediu na parede um palmo acima da cabeça do rapaz, fez um risco com o punhal, exclamando:

    - Quando o senhor crescer e chegar a este ponto, pode vir pedir minha filha em casamento.

    Algum tempo depois faleceu de febre tifóide o pobre Odilon, amigo íntimo, inseparável do Emilio Leite, filho do Juca Leite (José Leite de Faria) e de D. Cota, esta filha do snr. Claudio Augusto Ribeiro de Almeida.

    No dia do enterro do Odilon, a madrugada, o Emílio carregou seu colchão para o quarto de seus pais e o estendeu no chão, deitando-se. Ao ouvir-se o barulho, o Juca leite acendeu a vela.

    - Emílio, que é isto, meu filho? perguntou-lhe  D. Cota - Está doente?

    - Não senhora, respondeu ele.

    - Ó mãe! Agora é que vi que sou um patife!

    O rapaz refugiara-se noq uarto dos pais, com medo de seu amigo Odilon lhe aparecer.

Voz de Diamantina, Tempo Idos ARNO, Ciro.