Jubileu da Abolição dos Escravos

15-03-2011 23:13

Celebrando-se, este ano, o jubileu de ouro da Abolição da Escravidão no Brasil nos é reivindicar para o primeiro bispo de Diamantina a honra de ter sido um dos mais entusiastas dentre os abolicionistas mineiros.

            Espírito arguto no estudo das úlceras sociais do seu tempo e conhecedor esclarecido da doutrina da Igreja Católica de que era digno Pastor neste longínquo rebanho diamantinense, D. João Antônio dos Santos soube formar idéias justas e severas a respeito da escravidão dos africanos no Brasil.

            Seu corção, sua ciência, sua píedade  e seu patriotismo fizeram dele um resoluto aboliconista.

            Tendo-lhe D. Viçoso confiado, em 1845, a redação da Selecta Católica, deu á estampa vários artigos contra a escravidão, o que lhe valeu as iras dos assinantes possuidores de escravos. Devolveram o jornal, com o endereço a D. Viçoso.        

            “Recebido o pacote,  - conta o Cônego Severiano, - mandou o Prelado chamar o Redator a palácio e referiu-lhe o que se acabava de dar.

            - Então? – Disse-lhe D. Viçoso.

            - Neste caso, o remédio é muito fácil, - respondeu-lhe o interrogado. Eu me retiro da Redação e V. Exme. faça substituir por outro que não desagrade os assinantes.

            O Prelado não esteve pelo alvitre, acrescentando que ambos eram da mesma opinião sobre o magno assunto, e tanto assim que já havia publicado um escrito seu em prol da liberdade que se devia dar aos cativos.

            Entrados em acordo, continuou a escrever como dantes, no órgão oficial da Diocese, só deixando o cargo, que tão bem havia  desempenhado, quando teve de seguir para Roma”.

            Voltando ao Brasil, quer como padre, quer, depois, como bispo, D.João continuou defendendo as mesmas idéias a respeito da escravatura.

            Em 1870, com a valiosa colaboração da Câmara Municipal, chefiou, em Diamantina, a organização de uma Associação pia, cujo fim era promover e acelerar a emancipação dos escravos: a Irmandade de Nossa Senhora das Mercês.

            NO começo de julho de 1870, dirigiu aos possuidores de escravos a seguinte circular, em nome da Câmara Municipal:

            “Ilmo.Snr.

            A Ilustríssima Câmara Municipal desta cidade se dirige a todos os possuidores de escravos neste município, convidando-os para uma grande reunião nesta cidade, afim de tratar-se da libertação dos cativos nela existentes.

            Tomando eu parte na referida manifestação de humanidade e justiça, que será ao mesmo tempo uma distinção e uma glória para o nosso município, rogo a V. S., em nome da nossa Santa Religião, que aceite o convite que lhe é feito,e que, ainda com sacrifício, não deixe de nela comparecer no dia marcado.

            Deus nosso Senhor o abençoe e toda a sua família.

            Sou, com estima,

                                               De V.S.

            Amigo e servo muito obrigado,

            João, Bispo de Diamantina”.

            No dia 11 de julho de 1870, houve a reunião, presidida pelo inclíto Diocesano e com a presença, entre outros cidadãos, dos Srns. Joséfino Vieira Machado, João Felício dos Santos, Dr. João Raimundo Mourão e Comentador José Ferreira de Andrade Brant. Ficou fundada a benemérita e patriótica “Pia Sociedade de Nossa Senhora das Mercês”.

            O Art Iº. Dos seus estatutos dizia: “Fica instituída nesta cidade da Diamantina, com o fim de auxiliar a emancipação do elemento servil, uma pia sociedade, sob os auspícios de Nossa Senhora das Mercês”.

            Em outros artigos dos mesmos estatutos vem mais especificada a finalidade da Associação. Vejamo-los:

            “Art. 3º - Serão aceitos donativos, ainda que sejam para alforria determinada, e neste caso não poderão ser aplicados a outro fim.

            Art. 6º - São considerados sócios honorários ou benfeitores quantos,... libertarem em nome dela, escravos de qualquer valor, ou prestarem serviços relevantes á causa da emancipação.

            Art. 7º - Todos os sócios tem o dever de proteger as causas de liberdade, quando justas.”

            No capítulo III, art. 10º, D. João  Antônio dos Santos é proclamado Presidente Perpétuo da Sociedade.

            Nas atribuições da Diretoria, estatue a letra d: “Alforriar escravos na proporção dos fundos sociais disponíveis, conforme as regras dos artigos 25 e 26”.

            Entre as atribuições dos Procuradores está (art. 20.; letra c) a de : “Inquirir com empenho quais os escravos que, por sua conduta e outras circunstâncias, devam ser preferidos pelos os benéficios da Sociedade.

            Art. 25º. – Em regra, para a alforria dos escravos, deverão ser preferidas as mulheres aos homens até a idade de 40 anos; as casadas ás solteiras; as que tiverem filhos vivos ás que não os tiverem; os que forem sócios aos que não o forem. Em igualdade de condições, recorrer-se á sorte.

            Art. 26º - Poderão ser auxiliados os escravos que tenham parte do dinheiro necessário para a sua alforria, ou cujos senhores façam abatimento no seu valor”.

            Nos anexos aos Estatutos, são para notados;

            “Art.Iº. – A Sociedade, cada ano e por meio de sorte, distribuirá prêmios de um conto de réis pelos seus sócios escravos que anualmente houverem contribuído com a quantia de 20$000, na razão de um prêmio por 50 dos sócios.

            Art. 3º - Se a quantia saída por sorte não cobrir o preço da liberdade do escravo premiado, a Sociedade o poderá inteirar com os fundos que tiver em caixa”.

            O capítulo único da letra B dos anexos estatue:

            Art. 1º - Desejando auxiliar os seus membros escravos por todos os modos possíveis, a Sociedade por eles distribuirá pela sorte cada ano, prêmios de 200$000.

            Art 2º - No fim do cinco anos, os mesmos terão o direito a um auxílio de 75$000; no fim de dez, 180$000; no fim de vinte, 520$; no fim  de 25 a 29, um conto de réis”.

            Está-se vendo a eficiência com que a Sociedade se propunha promover e incentivar a emancipação do elemento servil, tudo sob a orientação sábia de D. João.

            O primeiro Bispo de Diamantina escreveu, em 28 de setembro de 1887, uma vibrane Pastoral aos seus diocesanos, e nela se pronunciou francamente pela Abolição.

            Nesse importantíssimo e patriótico documento, tendo de anunciar ás suas ovelhas as festas do jubileu sacerdotal do papa Leão XIII, D. João recomendava, como a obra mais significativa e oportuna, a libertação dos cativos e o amparo aos que já tivessem obtido a liberdade.

            Essa Pastoral do virtuoso Antistite repercutiu grndesmente em todo o país.

            Quando o projeto da Lei Aúrea foi discutido no Senado, no dia 10 de maio de 1888, um Senador aboliconista, em abono de seu voto, citou a Pastoral de D. João e lembrou a sua proposta sobre um golpe de Estado.

            Um membro da oposição exasperou-se com a citação e bradou que o Bispo de Diamantina deveria ser “criminalmente responsabilizado pelo seu ato”.

            Por aí se avalia o peso da opinião do prelado mineiro na importância pendência.

            D. João, bispo de Diamantina, muitas vezes agasalhava os escravos, como também lhe dava de comer e dinheiro para seguir viagem.

            Entrato no ano de 1888, - narra o seu biográfo Cônego Severiano de Campos Rocha, , por muitíssimas vezes ía pelas ruas da cidade, e batia á porta de todas as casas onde houvesse possuidores de gente escrava, e aos mesmos pedia um grande favor, qual era o da liberdade para aqueles que assim conservavam e e gratuitamente o serviam.

            Desse modo, conseguiu na Diocese umas 2.000 cartas de alforrias.

            D. João e o 13 de maio, quando aqui chegou a notícia da libertação final de todos os escravos do Brasil.

            “No mesmo dia da sanção, por via telegráfica, foi a grata notícia transmitida para a Diamantina.

            Estando D. João no Biribiri, lá recebeu a grata notícia da comçeta extinção do elemento servil em nosso país, e logo mandou aprestar o troly em que costumava viajar e pôs-se a caminho da cidade.

                        Entetanto, e sem perda de tempo, ía-se preparando uma festividade pública, um sinal do contentamento de que exultavam quantos haviam tomado parte na grande luta e, portanto, na vitória de foi ela coroada.

            Enquanto isto se fazia, soube-se que D. João não tardaria chegar do Biribiri. Os organizadores da festividade, seguidos de pessoas de todas as classes, se dirigiram para o alto da cidade, e ao subirem a rua da Glória, avistaram o troly que conduzia o Prelado, descendo pela mesma rua. Estugaram então o passo e ao enfrentarem o carro, fizeram parar os animais, desatrelando-os, no intento de os substituir, o que não conseguiram, em obediência a D. João, que com eles desce a pé atravessando a cidade até o passo episcopal.

            A festa cívica realizou-se ao cair da noite, na praça fronteira ao Grupo Escolar, e que então o Paço da Municipalidade, e em cujo frontíspicio fartamente iluminado com lanternas de várias cores, flutuava a bandeira nacional.

            Junto ao alto paredão da Catedral construiu-se um luxuoso palanque reservado a pessoas gradas, das quais a primeira era D. João, a quem, na hora previamente ajustada, uma numerosa comissão composta de distintos abolicionistas, foi buscar ao palácio, acompanhando-os uma banda de música do Corão, do palácio para a praça.

            Uma vez no seu lugar de honra, em companhia de vários sacerdotes, executado o Hino Nacional, discursaram sobre o assunto do dia o Dr. Álvaro da Matta Machado, Arthur Queiroga, Dr. Francisco Rabelo, enaltecendo as peregrinas virtudes do Prelado e o muito que havia feito pela libertação dos escravos.

A Estrela Polar, D. João Antonio dos Santos – um dos mais célebres abolicionistas mineiros  1938.