A intendência dos diamantes

19-11-2013 23:30

A Intendência dos Diamantes foi criada em 1734, com o objetivo de fiscalizar a exploração dos diamantes em toda a área abrangida pela Demarcação Diamantina. Sua sede era localizado no arraial do Tejuco e, de acordo com atos posteriores, em sua organização havia um intendente, um contador, um fiscal e um escrivão.

A partir da descoberta de diamantes em território colonial, em 1729, a administração da atividade de extração realizou-se de diferentes formas. De 1729 a 1734, a exploração foi aberta aos particulares, mediante a cobrança de uma taxa de captação sobre cada escravo que trabalhasse na extração. Em 26 de junho de 1730 estabeleceu-se o primeiro regimento de mineração dos diamantes, determinando que o ouvidor da vila do Príncipe, à qual a região diamantina estava administrativamente subordinada, fosse o superintendente das terras diamantinas da comarca.

A abundância das descobertas provocou uma queda no preço dos diamantes no mercado internacional, fazendo com que a Coroa tomasse algumas medidas para conter a exploração desordenada. Para tanto, foram enviados o comissário Martinho de Mendonça Pina e Proença e o engenheiro Rafael Pires Pardinho para demarcar a região produtora e estabelecer uma forma mais adequada para a arrecadação dos direitos reais. Em 1734 foi proibida a mineração de diamantes e extinta a capitação. Nesse mesmo ano estabeleceu-se a Intendência dos Diamantes, sendo nomeado Rafael Pires Pardinho para o cargo de intendente. (FURTADO, s.d., p. 1-4; CARRARA, 2005, p. 42-43; SALGADO, 1985, p. 91).

Em 1740 foi instituído o sistema de contratos, prática comum na administração portuguesa, os quais seriam arrematados a cada quatro anos. Colocando a exploração nas mãos de particulares a Coroa tinha seus rendimentos garantidos, sem a necessidade de prover a organização do trabalho efetivo. Os primeiros contratadores foram João Fernandes de Oliveira e Francisco Ferreira da Silva. Nesse contexto, cabia à Intendência fiscalizar a execução dos contratos e evitar contrabandos. Posteriormente, no entanto, diante das desordens cometidas pela administração dos contratos e dos conseqüentes prejuízos,o alvará de 11 de agosto de 1753 determinou que o contrato e o comércio de diamantes passassem à proteção real, revogando o direito dos contratadores de comercializarem os diamantes. Este alvará, entre outras disposições, obrigava também os comerciantes que entrassem nas terras diamantinas a darem entrada na Intendência, declarando as mercadorias trazidas e solicitando a autorização da câmara e do intendente para o estabelecimento de lojas, tabernas e outras casas públicas. Ao intendente cabia ainda abrir devassas contra os contrabandistas e fiscalizar todo o distrito (FURTADO, s.d., p. 4; PORTUGAL, 1830, p. 161-164).

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A partir do reinado de d. José I, verificou-se uma nova orientação na política econômica, promovida pelo ministro Sebastião José de Carvalho e Melo, futuro marquês de Pombal, que se baseava em uma prática mercantilista apoiada no fiscalismo. Várias reformas foram então empreendidas, dentre elas a reorganização da administração fazendária do Reino, visando uma maior eficiência na arrecadação dos direitos reais, a fim de fortalecer os monopólios régios.

Nesse período, portanto, as determinações relacionadas à administração do ouro e diamantes no Brasil foram marcadas pela tentativa de controlar sua exploração de modo mais efetivo (SALGADO, 1985, p. 36). O alvará de 12 de julho de 1771 representou esta política centralizadora, extinguindo o sistema de contratos e fixando o monopólio real da extração e venda dos diamantes do Brasil, que ficaria sob inspeção do Erário Régio, órgão criado no contexto das reformas pombalinas, em 1761, com a finalidade de concentrar a contabilidade do Reino e domínios. Constituiu-se também, em Portugal, uma Diretoria da Real Extração dos Diamantes das Minas do Brasil, composta pelo inspetor-geral do Erário Régio, o próprio marquês de Pombal, por três diretores estabelecidos em Lisboa e três caixas administradores. Meses depois, o alvará de 2 de agosto de 1771, conhecido como “ livro da capa verde”, regulou a atuação desses caixas que, como indica a legislação, deveriam atuar em conjunto com o intendente dos Diamantes na recém-criada Junta da Administração Diamantina do Tejuco.

Foi fixada também uma série de disposições com o objetivo de coibir o contrabando, como o reforço à proibição de entrada nas terras da demarcadas sem a licença do intendente e dos caixas administradores, a proibição ao comércio ambulante praticado pelas negras de tabuleiros, o registro dos escravos existentes na área e a redução do número de lojas, que eram acusadas de extraviar diamantes na região. Ainda segundo o alvará de 1812 cabia ao intendente dos Diamantes, além de tirar devassas, auxiliar os três caixas administradores, punindo-os em caso de transgressão a alguma ordem real, e exercer a função de juiz conservador da Administração Diamantina (WEHLING, 1986, p. 125; PORTUGAL, 1829a, p. 559).

Em 1772, o alvará de 23 de maio ordenou que todo fiscal da intendência fosse, daquele momento em diante, letrado e nomeado diretamente pelo rei, competindo-lhe substituir o intendente em caso de ausência. Anos depois, o alvará de 13 de maio de 1803 previu a instituição de uma Junta de Fazenda no Arraial do Tejuco, centro do distrito Diamantino, e a abolição dos lugares de intendente e de fiscal dos Diamantes o que, no entanto, parece não ter acontecido, visto que estes aparecem em legislação posterior.

Com a transferência da corte para o Brasil em 1808 algumas medidas foram tomadas com a finalidade de melhorar a administração dos diamantes. Em 5 de setembro de 1808 foi criada, no Erário Régio, a Diretoria e Administração da Extração Diamantina, que se regularia como a existente em Lisboa, ficando sob a inspeção do presidente do próprio Erário e tendo como diretores outros membros do órgão. Nesse contexto, o decreto de 14 de setembro de 1816 deu instruções para melhorar os trabalhos da Intendência dos Diamantes, prescrevendo um método de amortizar a dívida antiga e evitar a formação de nova, determinando melhorias nos trabalhos da extração e diminuindo para dois o número de caixas administradores no Arraial do Tejuco.

Após a independência, a administração diamantina passou por uma série de reformas, levando à lei de 24 de outubro de 1832 que extinguiu a Intendência dos Diamantes, juntamente com grande parte dos órgãos relacionados à administração do ouro.

Angélica Ricci Camargo

 

Documentos sobre o órgão podem ser encontrados nos seguintes fundos do Arquivo Nacional:

BR AN,RIO NP – Diversos Códices SDH – índice de assuntos – códice 807: ‘Diamantes, Mineração’

 

Bibliografia

CARRARA, Ângelo Alves. Desvendando a riqueza na terra dos diamantes. Revista do Arquivo Público Mineiro, Belo Horizonte, v. 41, p. 40-59, jul.-dez. 2005. Disponível em: https://www.cultura.mg.gov.br/arquivos/Gabinete/File/revista-apm-2005.pdf. Acesso em: 13 maio 2008.

FERNANDES, Simone Silvestre. Arraial do Tijuco. In: SILVA, Maria Beatriz Nizza da (coord.). Dicionário da história da colonização portuguesa no Brasil. Lisboa: Verbo, 1994. p. 74.

______. Intendência dos Diamantes. In: SILVA, Maria Beatriz Nizza da (coord.). Dicionário da história da colonização portuguesa no Brasil. Lisboa: Verbo, 1994. p. 442-444.

FURTADO, Júnia Ferreira. O Distrito Diamantino. Disponível em: https://www.fafich.ufmg.br/pae/apoio/distritodiamantino.pdf. Acesso em: 13 maio 2008.

______. Relações de poder no Tejuco ou um teatro em três atos. Tempo, Rio de Janeiro, v. 4, n. 7, p. 129-142, jul. 1999. Disponível em: https://www.historia.uff.br/tempo/artigos_livres/artg7-6.pdf. Acesso em: 13 maio 2008.

LOBO, Eulália Maria Lahmeyer. Processo administrativo ibero-americano: aspectos socioeconômicos, período colonial. São Paulo: Biblioteca do Exército, 1962.

PORTUGAL. Alvará de 11 de agosto de 1753. Fixando o comércio exclusivo dos diamantes do Brasil, que fica debaixo da proteção real. Coleção da legislação portuguesa desde a última compilação das ordenações redigida pelo desembargador Antônio Delgado da Silva. Legislação de 1763-1774, Lisboa, p. 161-164, 1830. Disponível em: https://www.inslusitaniae.fcsh.unl.pt. Acesso em: 3 set. 2007.

______. Alvará de 2 de agosto de 1771. Regula a administração e extração dos diamantes do Brasil, transferida para Fazenda Real por decreto de 12 de julho. Coleção da legislação portuguesa desde a última compilação das ordenações redigida pelo desembargador Antônio Delgado da Silva. Legislação de 1763-1774, Lisboa, p. 551-564, 1829a. Disponível em: https://www.inslusitaniae.fcsh.unl.pt. Acesso em: 4 jun. 2007.

______. Alvará de 23 de maio de 1772. Regimento do fiscal dos Diamantes. Coleção da legislação portuguesa desde a última compilação das ordenações redigida pelo desembargador Antônio Delgado da Silva. Legislação de 1763-1774, Lisboa, p. 284-287, 1829b. Disponível em: https://www.inslusitaniae.fcsh.unl.pt. Acesso em: 4 jun. 2007.

______. Alvará de 13 de maio de 1803. Regulando as minas de ouro e diamantes na América, com diversas providências e novos estabelecimentos. Coleção cronológica da legislação portuguesa compilada e anotada desde 1603 [1603-1700]. Lisboa, p. 202-222, v. 2, 1855.

SALGADO, Graça (coord.). Fiscais e meirinhos: a administração no Brasil colonial. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.

SILVA, Maria Beatriz Nizza da. D. João V e a política para a extração de diamantes. Revista do IHGB, Rio de Janeiro, v. 168, n. 434, p. 133-141, jan.-mar. 2007.

WEHLING, Arno. Administração portuguesa no Brasil de Pombal a d. João (1777-1808). Coord. Vicente Tapajós. Brasília: Centro de Documentação, Informação e Difusão Graciliano Ramos; Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército, 1986. (História Administrativa do Brasil, v. 6).

Referência da imagem

Mapa dos diamantes pertencentes ao 6º contrato remetido do Arraial do Tejuco (1768) Arquivo Nacional. Fundo: Secretaria do Estado do Brasil, códice 97, v. 1, f. 5 (código do fundo: 86).