Bairro da Palha

27-11-2010 22:27

     Segundo Douglas Koscky Fernandes gostava de ir com a empregada á sua casa, domingo, depois do almoço. Lembrava-me da Belinha, a preta de cara carrancuda. Mas boazinha. Ela morava lá na Palha. Íamos pelo Arraial de Baixo, onde havia morangos, as pitangas, as flores que estouravam nos dedos como balõezinhos e as varinhas de bambu. A gente precisava ter cuidado com as vacas bravas, que costumavam aparecer no caminho. Cercando o pequeno terreiro, os muros baixinhos, de pedras empilhadas. Depois de sua casa, havia uns dois ou três casebres semelhantes. Era bom correr naqueles caminhos de areia branca e sentir o sol que ali parecia diferente.

    Pedrelina foi outra empregada que não esqueci. Morava no Burgalhau, em frente á Capela de Bambães. Só saiu lá de casa para se casar com o Geraldo pedreiro. O casamento se realizou de tarde e teve doces á vontade. Doces de leite, de mamão, de cidra, de figo, e bolos de todo jeito.

    E na época da Revolução muitos se tornaram "bate paus", marchando desajeitados. Tio Ramiro estava no meio, de calça, camisa e casquetes amarelos e gravata preta. Quando acabou tudo, o Cabo Pereira, nosso primo, trouxe aquele pedaço de bala de canhão, mostrando-o orgulhoso ás visitas e contando histórias das trincheiras.

    A turma, então, já era outra, e se brincava mais no Largo do Rosário e na Cavalhada, aquele mundo de espaço com coqueiros sempre carregados, o pé de sabão de soldado (fruto com sementes esférica, preta e dura, depois de seca), o ingazeiro, os amplos gramados onde se faziam as peladas de futebol e se armavam os circos ou os parques de diversões. Mais além, descendo-se a ladeira do Lava Pésm ao lado da Cadeia , ia ao Beco do Moinho. Um beco sem casas, estreito, acidentado, mais um caminho, só vendo ali piteiras, calangos e lagartixas. Por ele chegava ao Córrego do Rio Grande, havendo do outro lado murtas, gabirobas, jabuticabas cabeludas, araçás, e frutas assim. Quando se ia pescar lambaris, era também por ali que se passava. Lá embaixo, a gente via, de longe, as saracuras e os frangos d'água, que desapreciam ao nos aproximarmos. Descendo-se o rio, passava-se pela chácara de Chico Souza, curtume, chácara de Doutor Elizardo, Palha, Luiz de Brito, chegando-se até a Gruta de Lourdes, inde terminava a pescaria. ( do livro Diamantina Uma Saudade).