Curiosidade de casamento e nascimento

25-08-2011 12:35

    O sino da Sé batera três horas numa fria madrugada de nossa terra. A garoa lá fora peneirava fina e um ventinho cortante anestesiava as orelhas e ponta do nariz dos notivagos obstinados.

    Nessa noite de inverno a cama macia e quentinha ainda é o maior invento da humanidade. Mudando o homem da cansativa posição vertical, coloca-o numa deliciosa horizontal de um leito gostoso e confortável. A esposa do Zeca deitada a direita do marido chamou-o. Acorde e vai buscar a parteira. A festa é para hoje se não for prá já. Ele sonolento, esfregando os olhos, abrindo a boca como o leão da "Metro" respondeu: Não pode ser um pouco mais tarde. Fique sossegadinha, procure dormir e tudo passará. Talvez seja rebate falso. Espere ao menos o dia clarear. Nada disto, retruçou ela. Salte da cama e vá depressa buscar Siá Agostinha se não quiser além do carpinteiro efetivo, ser parteiro nas horas vagas. Cruz, credo. A coisa de fato não é brincadeira nem adiável pois o genipapo quando está maduro, cai da árvore por si. O homem pulou meio tropego da cama, tomou o cavú dependurado atrás da porta, amarrou um lenço de alcobaça no pescoço, fez uma careta de aborrecimento e bateu o trinco caindo na aragem fria da rua... Tomou a direção do Burgalhau onde residia a velha aparadeira de muitas gerações diamantinenses. Era uma mulata analfabeta tão querida das assistidas, que apoiada por elas, obrigava-nos chamá-la de mãe Agostinha e tomar-lhe a benção. Bateu e esperou pouco para a "comadre" em passadas de quase noventa quilômetros a hora. Num instante pô-la a cabeceira da esposa. Estava salva a pátria. Adeus cama. Agora um cafezinho mais forte para espantar o sono e fazer boca de pito. O grito de uma vida não tardou e mais um estômago veio viver a custa de um enxó: Um chorinho forte anunciou a chegada de uma pirralha, mas a luta continou. Água quente, sabonete, toalha, tesoura, óleo de ricino cueiro, chumaço de algodão, rolão para curativo do umbigo e etc, tal. Como depois das bordoadas vem os curativos e da tempestade a bonança, apareceu o infalível cálice de vinho do Porto que se usava nestas ocasiões, encerrando a festa e  tomado a saúde da recém nascida. No dia seguinte a hora do banho da criança, estava presente o pai, que pediu a camisinha que a filha vestia, pô-la numa caixa de madeira reforçada juntamente com uma garrafa de vinho do Porto e foi para o quintal, onde abriu uma cova e enterrou tudo. Superstição, macumba, feitiçaria, nada disse a ninguém: Passaram se anos e no dia do casamento da filha foi ao quintal e desenterrou tudo. No ato civil entregando-lhe a camisinha falou alto. Quando não se quer tomar conhecimento de um fato ou dar-lhe importância, diz-se que tem tanto valor como a primeira camisa que se vestiu. Isto porque não existe mais: Você nunca dirá isto porque ela está em suas mãos e não permita que ninguém fale porque a sua existe. Pilus (Voz de Dtna). Quantas garrafas de vinho do Porto devem está enterradas nos quintais das casas de Diamantina?