Descoberta dos diamantes e a população mestiça

12-01-2013 10:51

Nessa pequena história da região, entre o início de sua ocupação até aproximadamente 1752, Caetano abordou diferentes questões como: a fundação da vila, o descobrimento dos diamantes, as oscilações na administração e nas formas de concessão das lavras, e as técnicas de mineração dos diamantes. A fundação da Vila do Princípe foi atribuída pelo Ouvidor, de forma inédita, aos caprichos de uma negra. Segundo sua descrição, o pelourinho foi erguido por ordem do Ouvidor de Sabará, Luis Botelho de Queirós, em um local distante apenas duas léguas do arraial do Tejuco. Mas, passado pouco tempo, o juíz Antônio Quaresma mudou a povoação para um novo sítio, onde está até hoje, distante do arraial nove léguas, tudo "a instância de uma sua amiga negra, por nome Jacinta, existente ainda hoje, que vivia naquele sítio com lavras suas".

 Como Jacinta, nas Minas no século XVIII, eram muitas as negras e mulatas que estabeleciam relacionamento ilícitos com o sexo oposto. Essa prática era resultante, entre outros motivos, da conformação do povoamento, onde os homens compunham a maioria absoluta da população, fruto das características inerentes á atividade mineratória: seu caráter urbano, efêmero, itinerante e de aventura,e tc. No caso da região diamantina, de povoamento recente, esta desproporção era acentuada. Ao examinar o censo de 1738, relativo á Comarca do Serro do Frio como um todo, da qual o Distrito Diamantino fazia parte, depreende-se que do total de 9.681 habitantes 83,5% eram homens e 16,5% eram mulheres. Entre os escravos, este último segmento representava apenas 3,1%, pois eram obtidos prioritariamente para o trabalho da mineração, mais afeito aos homens.

                                         Garimpeiro dos Quartéis do Indaiá - S.J. da Chapada - Diamantina

 Já entre os forros, as proporções se invertiam, e as mulheres passavam a ser majoritárias. No mesmo censo, do total de 387 forros, elas constituíam 63%, contra 37% de homens, indicativo de que eram as que mais se beneficiavam da alforria, inclusive acumulando bens, como as lavras de Jacinta. Uma vez livres, essas mulheres oscilavam entre a desclassificação social e a inserção, ainda que desajeitada, no universo antes restrito aos brancos livres da Capitania. Esta última possibilidade, cada vez mais comum, escandalizava o Governador das Minas, o Conde de Golvêas que, em 1733, procurou reprimir "os pecados públicos que com tanta soltura correm desenfreadamente no arraial do Tejuco, pelo grande número de mulheres desonestas que habitam no mesmo arraial com vida tão dissoluta e escandalosa que, não se contentando de andarem com cadeiras e serpentinas acompanhadas de escravos, se atrevem irreverentes a entrar na casa de Deus com vestidos ricos e pomposos e totalmente alheios e impróprios de suas condições".

                                              Vista da Casa da Chica da Silva - Diamantina-MG

 A descoberta dos diamantes foi o principal tema que emergia de sua descrição da região e é, ainda hoje, um tema nebuloso para os historiadores. Entre outros fatores, porque os próprios partícipes do acontecimento trataram de cercá-lo de mistérios e mal entendidos. Distantes as datas entre a descoberta das preciosas gemas e a sua oficilização, circularam várias versões de como a primeira se deu de fato, já que os documentos oficiais preservados nos arquivosm datam do segundo momento - 1729. Nesse ano, Dom Lourenço de Almeida enviou o comunicado oficial da descoberta, aparentemente pressionado pela notoriedade da mineração clandestina das pedras, do qual ele próprio era um dos suspeitos de tirar vantagem até então . Irmão do patriarca de Lisboa e cunhado do secretário de Estado, governador das Minas entre 1721 e 1731. Dom Lourenço retornou á Corte com cerca de 18 milhões de cruzados, riquezas auríferas eam diversos negócios  que se envolveu, entre eles os diamantes".

 Notícias de descobertas de diamantes no Brasil remontaram a segunda metade do século XVI. Por essa época, partiram de Porto Seguro e Espírito Santo as expedições de Fernandes Tourinho (1572), Antônio Dias (1574) e Marcos de Azeredo (1596) que penetraram na região pelo Rio Doce e deste para os rios Jequitinhonha, Araçuaí, Caravelas e Mucuri, atingindo o pico do Itambé. Ambrósio Brandão, no Diálogo das Grandezas do Brasil, escrito em 1618, já enumerava os diamantes como uma de suas riquezas", e 

                                       Vista do Pico do Itambé - Visão da cidade de Diamantina

certamente esses se encontravam entre as pedras que Marcos de Azeredo depositou aos pés de Felipe II em Madrid, ao voltar de sua expedição. Em 1702, Frei Antônio do Rosário anotou que os diamantes do Brasil eram mandados "não em bizalhos, mas em caixas, que todo ano vem a este reino", de sorte que tinham convertido estas terras na verdadeira Índia de Portugal, "pois a Índia já não é Índia". Mas apesar dessa notícias esparsas, somente com os achados de diamantes na comarca do Serro do Frio, no segundo quartel do século XVIII, a América Portuguesa se tornou grande produtora de diamantes.

 Revista do Departamento de Historia, Número Especial Códice Costa Matoso,Varia Historia, nº21, 21 de julho de 1999, pág. 295-297, Fundação João Pinheiro, UFMG, BH, 1999