jornais mineiros

25-07-2015 22:53

III Encontro Nacional da Rede Alfredo de Carvalho

Novo Hamburgo, RS - 2005

 

GT de História da Midiologia

_______________________________________________________________

 

 

MEMÓRIA DOS JORNAIS MINEIROS DO SÉCULO XIX: Revisão crítica das fontes historiográficas

 

Prof. Ms. Jairo Faria Mendes – PUC Minas – Arcos / MG

 

RESUMO: O jornalismo surgiu nas Minas Gerais de forma tímida e tardia. Além disso, os estudos sobre a imprensa mineira no século XIX ressaltam que os jornais na província eram moderados. Isso contrastava com outras regiões, que possuíam uma imprensa combativa, maledicente e agressiva. Quando foi criado o primeiro jornal das Gerais, o Compilador Mineiro, em 13 de outubro de 1823, o Rio de Janeiro, a Bahia e Pernambuco já tinham várias publicações bastante atuantes.

Nas décadas de 1820 e 1830, os jornais mineiros eram muito frágeis, e de vida curta. Uma exceção foi O Universal, que tinha a frente o polêmico Bernardo Vasconcelos. Só a partir de 1825, a província teve mais de uma publicação circulando. A imprensa de concentrava em Ouro Preto, mas, a partir de 1827, surgiram jornais em outras cidades em que a mineração era forte.

Na segunda metade do século XVIII, quando ocorreu a decadência na mineração do ouro, outras regiões da província começaram a ganhar importância, como a Zona da Mata e o Sul das Minas, e isso, bem mais tarde, se refletiria na imprensa. Esses locais, em meados do período oitocentista, ganharam destaque no jornalismo mineiro.

A nova capital, que tinha o nome Cidade de Minas (hoje se chama Belo Horizonte), já nasce com uma imprensa diversificada. Antes mesmo de sua fundação, que ocorre em 12 de dezembro de 1897, a nova capital já contava com cinco periódicos. Em 1902, quatro anos após a sua fundação, já havia surgido na cidade 41 jornais e 8 revistas.

Apesar do jornalismo ter sido tardio e demorado a se consolidar nas Minas, importantes personalidades da imprensa brasileira são da região, como o Frei Veloso (fundador e diretor da Oficina do Arco do Cego, em Lisboa) e o padre Viegas (que realizou uma impressão calcográfica, em 1806 ou 1807).

 

PALAVRAS-CHAVE: Imprensa mineira, memória do jornalismo, século XIX

 

 

1.1 A impressão nas Gerais

 

 

            Na capitania não houve nenhuma tentativa de implantação de tipografias no período setecentista, considerado o século das Gerais, pela grande importância que a capitania recebeu por causa de sua riqueza em ouro e diamantes. E os relatos históricos mostram que a região vivia em efervescência política e cultural.

No entanto, o mineiro frei José Mariano da Conceição Veloso, primo do mártir José Joaquim da Silva Xavier (conhecido como Tiradentes), foi uma das principais personagens da imprensa brasileira. Foi ele o fundador e diretor da Oficina Tipográfica, Calcográfica e Literária do Arco do Cego, em Lisboa, que funcionou apenas de 1799 a 1801. O local foi um ponto de encontro de intelectuais brasileiros e, principalmente, mineiros. Precursores da imprensa brasileira eram freqüentadores da Oficina e, certamente, lá aprenderam muito da arte da impressão. São os casos de Hipólito da Costa, o fundador do primeiro jornal brasileiro (Correio Braziliense), e o padre José Joaquim Viegas de Menezes, o precursor da imprensa e do jornalismo mineiro.

             Em 1807 (ou 1806), o padre Viegas realizaria a primeira impressão conhecida nas Minas. Segundo Cunha (1986), ele também foi a primeira pessoa a realizar uma gravação em metal no Brasil. Foi um poema, também chamado de canto panegírico, homenageando o governador da capitania das Minas Gerais, Pedro Maria Xavier de Athayde e Melo, o visconde de Condeixa. O religioso não era político, mas parece que ele procurava manter boas relações com as autoridades eclesiásticas e política. Os clérigos o descreveram como dedicado, piedoso e humilde.

            A história da primeira impressão mineira começou quando o cronista e literato Diogo Pereira Ribeiro de Vasconcellos escreveu um poema homenageando o governador, no aniversário deste. O governador quis, de todas as formas ver o texto impresso, e sabia que em Vila Rica havia uma pessoa que tinha conhecimentos gráficos: o padre Viegas.

            Com isso, surgiria a primeira impressão mineira reconhecida pelos historiadores. De acordo com um trabalho biográfico publicado no Correio Official de Minas, em 1859, o padre há anos já fazia algumas impressões de estampas religiosas, em seus horários de folga, e presenteava amigos. Mas agora o governador lhe pedia algo maior, que certamente desagradaria o governo português. No entanto, o padre aceitou realizar a tarefa por o governador garantir que assumiria toda a responsabilidade pela impressão.

            A biografia publicada no Correio Official de Minas, descreve um diálogo entre o padre e o governador. O autor do trabalho diz que ouviu o padre Viegas repetir muito essa conversa.

 

“-   Meu Viegas, lhe disse, está resolvido o problema.

-          Como, sr.?

-          Como lhe digo; querendo o meu Padre dar-me mais uma prova de sua dedicação e amizade.

-          Todas, quantas v. excia. de mim exija e caibam em minhas forças e pequena habilidade.

-          Pois bem; o meu Padre tem já feito alguns ensaios de trabalhos calcográficos, imprimindo para o seu divertimento e para brindar alguns amigos, diversas estampas, nas quais têm gravado não só os nomes dos santinhos, como também algum dístico alusivo aos mesmos etc., ora, não é tão possível levar esses ensaios a um ponto maior, gravando estes versinhos que tanto me agradam?

-          Já tive a honra de assegurar a v. excia. que estava pronto a fazer quanto em mim coubesse para comprazer-lhe, entretanto permita v. excia. uma pequena reflexão...

-          Sobre o grande trabalho que vai ter em conseqüência da extensão da poesia?

-          Não, sr.; é sobre o comprometimento que a v. excia. possa provir, atenta a proibição de trabalhos tais, em vista das ordens que do reino tem sido expedidas.

-          Oh! Si é só isso não se aflija, tomo sobre mim toda a responsabilidade: mãos a obra, meu Padre.”

 

 

1.1 A calcografia

 

 

A técnica utilizada pelo padre foi a calcografia, que utiliza chapas de metal fixas. Ele também conhecia de tipografia, mas para utilizar os tipos móveis teria primeiro que importar ou construir um prelo, o que era muito mais custoso e perigoso. A técnica calcografia também era complexa, exigia maquinas e pessoal qualificado. Mas havia nas Minas um local onde era possível encontrar isso, a Casa da Moeda.

Foram três meses de trabalho duro, aplainando, polindo e abrindo onze chapas de cobre de diversos tamanhos. O impresso era composto de 14 páginas, tendo a frente uma ilustração do governador ao lado da esposa, duas páginas com dedicatória ao estadista, dez contendo o poema, e uma com o “Mappa do donativo voluntario que ao Augusto Príncipe R.N.S. offerecerão os povos da Capitania de Minas-Geraes, no anno de 1806”. Na dedicatória é utilizado o corpo 8, no poema corpo 12, e no mapa corpos 6 e 7.

            O trabalho era complexo exigindo muito conhecimento técnico (o que Viegas tinha em abundância), habilidade, equipamentos e auxílio de pessoal especializado. Os historiadores acreditam que isso pode ser encontrado na Casa da Moeda. Cunha (1986) descreve como é a técnica calcográfica, utilizada na impressão:

 

“Consiste a técnica da gravura a buril em descalcar sobre a prancha de cobre um desenho e, sobre este, ‘abrir’ um sulco com auxílio de um instrumento, o buril (...) A segunda etapa do burilista consiste em tintar a prancha, isto é, com auxílio de uma esponja embebida em tinta, a ‘boneca’, espalhar uniformemente o líquido (...) A terceira etapa (...) a prancha calcográfica, pressionada fortemente numa prensa cilíndrica, vai transferindo a tinta para o papel, onde fica estampado o desenho” (p. 22) 

 

            Existem atualmente apenas quatro cópias dessa impressão: uma no Arquivo Público Mineiro, duas na Biblioteca Nacional e outra na Biblioteca do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Cunha (1986) acredita que podem ter sido produzidas apenas estas quatro cópias, por causa do grande trabalho que era imprimir através da calcografia, e dos riscos que existiam. Ela também diz que é difícil entender como foi possível a impressão. “Teria trazido as chapas de Portugal? Como teria reunido tantas folhas de papel para um empreendimento ilegal?”(CUNHA,1986, p. 27).

            Viegas era um grande conhecedor das artes da impressão. O trabalho gráfico é de muita precisão, de acordo com Cunha (1986). “É obra de artista habituado a se utilizar de instrumento de gravar tal como o buril”(CUNHA, 1986, p. 30).

 

 

1.2 Literatura medíocre

 

 

            O poema impresso é péssima qualidade. O autor, Diogo Pereira Ribeiro de Vasconcelos, não tinha nenhum talento para a literatura, apesar de ser amigo de grandes escritores da época, como Cláudio Manoel e Tomaz Antônio Gonzaga. E ele parece reconhecer sua mediocridade na apresentação de seus versos, em que se desculpa: “Queira pois V. Excia. aceitar nas seguintes mal rimadas e indigesta oitavas...”

            Além disso, a obra tinha o claro objetivo de “bajular” ao governador. Como diz Cunha (1986): “emana das estrofes tom lisonjeiro de patente servilismo” (p. 25).

 

1.3 A tipografia

 

Segundo João Pedro Xavier da Veiga, na monografia A Imprensa em Minas Gerais, publicada na Revista do Arquivo Público Mineiro, em 1898, nas Minas foi construída a primeira tipografia do Brasil. Novamente, aparecia o brilhantismo de Viegas, o principal responsável pelo feito. A tipografia não era a primeira construída no país (como diz Xavier da Veiga), bem antes já havia sido feito uma no Rio de Janeiro, mas a façanha do padre mineiro era admirável.

            Morava em Vila Rica, em 1820, o português Manoel José Barbosa Pimenta e Sal, que trabalhava como chapeleiro e sirgueiro, e tinha muito talento para a mecânica. Ele gostava muito de ler, mas não compreendia o principal livro de sua estante, que Xavier da Veiga (1898) diz ser um dicionário de Sciencias e Artes[1], em Francês, língua conhecida por pouquíssimas pessoas na capital mineira. Por isso, o português folheava e olhava as ilustrações do livro, sem compreender o seu conteúdo. Costumava parar nas páginas com desenhos de equipamentos tipográficos.

            O padre Viegas, que conhecia francês, traduziu este texto para o chapeleiro e explicou como funcionava e o que compunha uma tipografia. Os dois tornaram-se amigos e resolveram construir uma tipografia, que ficou pronta em 1821. Depois de pronta, Viegas deixou-a com Manoel José Barbosa. No entanto, a tipografia só receberia autorização para funcionamento em 20 de abril de 1822. Lá seriam impressos os primeiros jornais mineiros, como o Compilador Mineiro (1823), Abelha do Itaculumy (1824), o Universal (1825), o Companheiro do Conselho (1825) e o Diário do Conselho (1825). O diretor do primeiro jornal da província também foi o padre Viegas, que esteve a frente do Compilador Mineiro.

            A oficina recebeu o nome de Tipografia Patrícia, fazendo referência à pátria, ou seja, sua origem brasileira. O segundo jornal mineiro, a Abelha do Itaculumy, explica a escolha do nome “porque todos os seus utensílios foram aqui fabricados sem modelos, e sem outra direção, que o desenho achado em alguns livros; e para maior glória dos mesmos, grande porção de tipos se fundiu de chumbo extraído de nossas Minas” (apud COSTA FILHO, 1955, p. 10).

            Pela demora na autorização de funcionamento, essa tipografia acabou não sendo a primeira a entrar em atividade nas Minas Gerais. Uma tipografia oficial, criada pelo governo provisório, e descrita por Xavier da Veiga (1898) como “minúscula”, entrou em funcionamento alguns meses antes da construída pelo padre Viegas e seu amigo.

 

“Os documentos seguintes, existentes no Arquivo Público Mineiro, provam que já em fevereiro de 1822 funcionava a minúscula tipografia provincial, que aliás denominava se pomposamente – nacional...”(XAVIER DA VEIGA, 1898)

 

Na tipografia oficial foram impressas 500 cópias da fala do príncipe regente D. Pedro I, em 9 de abril de 1822, quando ele conseguiu o apoio de Vila Rica à luta pela independência.

 

“Fala que S.A.R. o Príncipe Regente do Brasil fez ao Povo e Tropa da Província de Minas Gerais no dia 9 de abril de 1822, quando chegou à capital dela:

 

Briosos mineiros, os ferros do despotismo começados a quebrar no da 24 de agosto, no Porto, rebentaram hoje nesta Província. Sois livres. Sois constitucionais. Uni-vos comigo e marchareis constitucionalmente. Confio tudo em vós: confiai todos em mim. Não vos deixeis iludir por essas cabeças que só buscam a ruína da vossa Província e da Nação em geral.

 

Viva El-Rei constitucional!

Viva a religião!

Viva a constituição!

Vivam todos os que forem honrados!

Vivam os mineiros em geral!”

 

            Outras duas tipografias seriam construídas nas Minas ainda na década de 1820, de acordo com Costa Filho (1955). O ourives Manuel Sabino de Sampaio Lopes, em 1828, preparou uma no Tijuco (hoje cidade de Diamantina). Lá foi impresso o Echo do Serro, o primeiro jornal da comarca.

            No mesmo ano, próximo ao Tijuco, no Arraial do Itambé, o ourives Geraldo Pacheco de Melo também construiu uma tipografia, em que seria impresso o Liberal do Serro, 22º jornal da província.

 

1.4 O jornal nas Minas Gerais

 

            Até o final de 1822 já haviam sido criados mais de 40 jornais no Brasil, mas as Minas ainda estavam a quase um ano de ter sua primeira publicação. E, mesmo depois de criado o primeiro jornal, ainda passaram alguns anos para que o jornalismo se consolidasse na província. Para alcançar o patamar que o Rio de Janeiro estava em 1822, por exemplo, as Minas tiveram que esperar cerca de uma década.        

            Com relação ao surgimento da tipografia, as Minas não foram tão tardias, mas ficaram atrás de algumas províncias, mesmo tendo a genialidade do padre Viegas e da tradição nas artes gráficas deixada pelo frei Veloso.

Além disso, a moderação prevaleceu na imprensa mineira oitocentista. Isso é descrito por Campos (1922), em Imprensa mineira, uma obra que resgatou a memória do jornalismo nas Gerais, no período de 1822 a 1922. Para Campos (1922) a imprensa das Minas se destacou com relação ao resto do país por sua prudência.

 

“O que não deve se deixar de lado, entretanto, é a ética da imprensa mineira, admirável de prudência e de bom senso, benéfica na sua moderada e esclarecida doutrinação, mesmo nas situações de maior melindre, ao embate violento das crises, em que ela sempre se manteve firme no propósito de bem orientar o espírito popular, nos transes amargos dos infortúnios nacionais”( p. IV)

 

            Costa Filho (1995) também diz, sobre os jornais, que “em Minas, a predominância cabia aos moderados” (p. 9). O autor ressalta que os primeiros jornais da província mantiveram essa postura conciliatória.

            Isso não quer dizer que os periódicos mineiros deixassem de fazer denúncias ou de participar das lutas políticas. A diferença dos jornais das Gerais é que esses não se posicionavam de forma tão agressiva como em outras regiões do país.

 

 

1.4.1 Os primeiros periódicos

 

 

            As Gerais poderiam ter tido seu primeiro jornal, em 1822, caso o plano do major Luiz Maria da Silva Pinheiro tivesse sido realizado. Ele, que era responsável pela tipografia provincial (denominada Nacional), em um ofício, de 8 de março de 1822, pedia recursos a fazenda pública e apresentava um Plano para a administração da Typografia Provincial (que na verdade era um orçamento) em que estava previsto a edição de “200 exemplares de uma folha diária, em 4 ou 3 dias por semana, em meia folha, na qual se incluam artigos oficiais do exmo. Governo, de interesse nacional, particular do Brasil e província, notícias gerais e variedades”.

            No entanto, não se realizou o projeto de criação dessa publicação oficial, provavelmente por falta de recursos financeiros.

A imprensa na província começou timidamente e mostrava fragilidade. Até 1825, as Minas não tiveram mais de um jornal circulando simultaneamente. O Compilador Mineiro, durou menos de três meses, de 13 de outubro de 1823 a 9 de janeiro de 1824. Era publicado três vezes por semana (segundas, quartas e sextas), e em sua curta vida produziu 29 edições. O jornal foi muito bem recebido pela população. O primeiro número esgotou-se rapidamente, e teve que ser reimpresso.

            Na primeira edição, o Compilador se colocava com um porta-voz da população.

 

“Oferecemos este nosso periódico aos Senhores que quiserem fazer públicas suas idéias, ou denunciarem à opinião pública os maus empregados bem como a estes para se defenderem vindo quando respeitar o não cumprimento de deveres, munidos de documentos, salvo os casos em que se não puderem reproduzir. Os nomes dos senhores correspondentes devem ser reconhecidos e os que não quiserem que seus nomes se façam publicar mande reconhecê-los em papel separado e se guardará segredo, exceto havendo ordem de Justiça para se descobrirem por acusação que haja ou se intente. Escusamos de advertir que tendo só em vista o bom público, nunca neste periódico terão lugar odiosas personalidades”. (apud CAMPOS, 1922, p. 3)

 

            Campos (1922) cita um exemplo de denúncias de leitores publicadas: “avisa o filantropo ao público que indo hoje o Capitão Mor ao hospital da cidade ainda não se tinha dado remédio aos doentes até às 8 horas da manhã e nem havia água” (p. 3).

            De acordo com Waldemar (1994), o jornal trazia notas oficiais, textos copiados de periódicos do Rio de Janeiro e reclamações, que eram publicadas em forma de avisos. O Compilador Mineiro era nacionalista, e se mostrava indignado com os portugueses e a administração colonial, segundo Waldemar (1994). O jornal também se mostrava um defensor da criação de uma universidade na província. Tendo em vista que seu diretor era o culto padre Viegas, pode-se entender o por quê dessa reivindicação.

            Campos (1922) apresenta alguns exemplos da atuação do primeiro jornal das Gerais. Um editorial protestava do valor pago a uma oitava de ouro na província, 16 vezes menor do que o preço no mercado internacional. A edição nº 13 criticava os altos custos da administração do Tijuco. “Com esta importância podia ser instalada uma universidade em Minas”, dizia. O nº 14 defendia o Projeto Gomide (do deputado Antônio Gonçalves Gomide) que previa a criação de uma universidade em Vila Nova da Rainha (hoje cidade de Caeté).

            Na edição nº 21, o jornal dizia que era necessário criar um canal de comunicação com o Espírito Santo através do Rio Doce. Nos números 22 e 24, a publicação trata da dissolução da Assembléia Constituinte.

            O Compilador fez algumas denúncias e protestos, mas seguiu uma linha moderada, de acordo com Costa Filho (1955). Fez elogios a D. Pedro I, como no artigo do padre Viegas, publicado na edição nº 5, de 22 de outubro de 1823, que trata o chefe de governo como “Imperador Constitucional identificado com a Nação”.

            Como era comum na imprensa da época, o Compilador não identificava quem era seu diretor e redator, e costumava publicar artigos e correspondências anônimas, assinadas com expressões como “Bom Mineiro”, “O Anti-Constitucional” e “Puro Brasileiro”.

            É interessante observar, que, em sua 12ª edição, o jornal utilizou uma linguagem enérgica para protestar contra uma suposta expedição que estaria sendo feita por Portugal para retomar o Brasil. Esse boato apareceria outras vezes na imprensa mineira, sempre tratado com muita seriedade. Em 12 de março de 1825, o jornal Abelha do Itaculumy, falava de uma poderosa armada que estaria vindo recolonizar o país, e dizia: “Independência ou morte! Atrás nem um passo” (apud COSTA FILHO, 1955, p. 12).

            Na última edição, o Compilador se despede elegantemente:

 

“O presente estado de nossa saúde e outras circunstâncias nos impossibilitam a continuação da redação desta Folha; o que nos é muito sensível pelo bom acolhimento que temos merecido do ilustre público desta província; penas muito mais hábeis se encarregarão desta interessante tarefa” (apud CAMPOS, 1922, p. 4)

 

            Com o fechamento do jornal, os assinantes foram reembolsados pelas edições que tinham pago antecipadamente.

            Até o início do século XIX, considerava-se que o primeiro jornal da província era o Abelha do Itaculumy. No entanto, em 1808, José Carlos Rodrigues, que era diretor do Jornal do Commercio, do Rio de Janeiro, publicou neste diário “curiosas e interessantes notas referentes ao Compilador Mineiro” (CAMPOS, 1922, p. 1). José Carlos Rodrigues possuía uma coleção quase completa do jornal (então desconhecido), tendo 25 das 29 edições do Compilador.

Depois do fechamento do Compilador, a província ficou apenas cinco dias sem jornais, ou seja, até 14 de janeiro de 1824, quando foi lançado o Abelha do Itaculumy. Ele também saia três vezes por semana (nas segundas, quartas e sextas), possuía quatro páginas, no formato 16 X 25 cm. Os primeiros jornais mineiros seguiram o mesmo padrão.

Waldemar (1994) destaca duas edições do Abelha, uma que publica, na íntegra, o projeto de Constituição do Império; e outra, que traz uma descrição geográfica da província.

O Abelha parece ter tido uma atuação mais discreta e conservadora que o Compilador. Em sua 2ª edição, o Abelha apresentou sua proposta de atuação:

 

“Conterá – 1º - objetos concernentes à legislação; 2º - Ditos ministeriais de imediatos interesses à Província; 3º - ofícios e documentos transmitidos pelo governo e mais autoridades da Província; 4º - correspondências e mais escritos tendentes à instrução pública; 5º - os artigos noticiosos, principalmente os que respeitarem à Província” (apud CAMPOS, 1922, p. 4 e 5)

 

O jornal se mostrava bastante moderado. Como descreve Costa Filho (1955), o Abelha dizia ser contra o “liberalismo exaltado”, a favor da “ordem e prosperidade pública” e defendia que “o germe da anarquia não vinga no solo de Minas Gerais”. Descrevendo uma das edições, Costa Filho (1955) deixa claro o perfil do jornal:

 

“(...) condena a vertigem revolucionária e a imprensa, que já se desmandava numa linguagem que não tardaria muito a atingir o paroxismo das diatribes e agressões pessoais. May é apontado de louco, enquanto se aconselha o povo a ser fiel e submisso ao Imperador” (p. 13)

 

Ao contrário do Compilador, o Abelha defendia o fim da rivalidade entre “brasileiros europeus e americanos”. Um exemplo disso é um dos colaboradores anônimos do jornal que assinava “português brasileiro”. No entanto, apesar de defender os portugueses residentes no país, o jornal se mostrou patriota diante do boato de uma invasão com o objetivo de recolonizar o Brasil. “Motivo bastante para o Brasil se ataviar de baionetas e canhões, e apresentar-se em atitude guerreira” (apud COSTA FILHO, 1955, p. 11). No Abelha saíram muitos boatos sobre invasões portuguesas, e movimentações de tropas mineiras para defender a independência.

As posturas do periódico eram, em sua maioria, conservadoras. Em 17 de março de 1825, o Abelha censurou o jornal Liberal, da Bahia, por defender “descaradamente as doutrinas mais sediciosas e mais jacobínicas” (apud COSTA FILHO, 1955, p. 12). Na próxima edição, falou dos conflitos existentes em outras províncias, que segundo o jornal, contrastava com o clima de paz existente nas Minas.

O Abelha lamentou por os republicanos e federalistas não estarem totalmente destruídos na Bahia. Também apoiou a dissolução da Assembléia Constituinte. Mas publicação fez muitas críticas ao comércio do Brasil com a Inglaterra, em que os bretões tinham inúmeras vantagens alfandegárias. 

Em 11 de julho de 1825, quando chegou à edição nº 82, o Abelha parou de circular, apresentando como motivo a venda da tipografia onde era impresso.

Em 18 de julho de 1825, uma semana depois do fim do Abelha, foi lançado O Universal, que teve como seu principal redator o polêmico político mineiro Bernardo Pereira de Vasconcelos. Esse foi o primeiro jornal mineiro com expressão, principalmente pelo seu redator maior. Também se mostrou bem mais crítico. Costa Filho (1955) diz que o periódico foi “citado pelo Barão de Inhomirim, da intimidade de D. Pedro I, ao lado da Astréia, da Malagueta, da Aurora Fluminense e do Farol Paulistano, entre os jornais dos famintos, o que equivaleria dizer hoje jornais dos marmiteiros, jornais benquistos pelo povo” (p. 17)

A publicação durou 17 anos, sendo que até 1833 teve a direção de Bernardo Vasconcelos. A partir daí, sob a direção de José Pedro Dias de Carvalho, fez oposição a Vasconcelos e aos conservadores. O novo proprietário tinha apenas 25 anos, e, talvez por sua juventude, tornou o jornal mais combativo. Dias de Carvalho foi um dos líderes do Partido Liberal. Foi presidente da província, em 1848, e também foi eleito deputado seis vezes, senador uma, e atuou como ministro da Fazendo em quatro ocasiões.

O Universal era bem mais combativo que os dois primeiros jornais mineiros. Até por que teve redatores polêmicos, como Bernardo Vasconcelos, que era considerado um liberal exaltado, mas depois tornou-se conservador; e Dias de Carvalho, do qual já se falou anteriormente. No entanto, Costa Filho (1955) também classifica esse jornal como moderado: “(...) fiel ao seu liberalismo moderado, discordava dos pernambucanos, entendendo que mais liberdade que tínhamos seria anarquia. Não deixava, porém, de ajuntar que menos seria despotismo” (COSTA FILHO, 1955, p. 18).

O jornal mostrava apoiar o imperador. Como diz Costa Filho (1955), “fazia vista grossa à realidade da ação despótica de Pedro I” (p. 18). Ele elogiou o chefe da nação por ter censurado o presidente interino do Maranhão, que embarcou para Lisboa, a força, o redator de O Censor, João Antônio Garcia de Abranches. O Universal dizia esse era um exemplo de como o governo imperial defendia a liberdade de imprensa. No entanto, sabia-se das perseguições a jornais e jornalistas realizadas por D. Pedro I.

A dissolução da Assembléia Constituinte também foi aplaudida pelo jornal. “(...) dizendo em suma, que os mineiros mantinham o seu respeito, fidelidade e adesão a Pedro I, ídolo dos brasileiros. Artigo bombástico, excessivamente laudatório e que, hoje, aos nossos olhos, parece subserviente” (COSTA FILHO, 1955, p. 24).

Mas o jornal participou de importantes lutas. As páginas do Universal foram utilizadas para denunciar a concessão da exploração de metais preciosos pelos ingleses. O jornal mineiro se engajou nessa luta, mostrando ser nacionalista. No entanto, um mineiro residente no Rio de Janeiro, que assinava como O Paraopebano, através do jornal O Fluminense respondia aos protestos do Universal, criando uma prolongada polêmica. Outros jornais das Gerais, como o Companheiro do Conselho e o Patriota Mineiro, ficaram ao lado do Universal na defesa das riquezas minerais da província.

O Universal dizia ter recebido mais de 50 cartas de pessoas indignadas com a concessão feita aos ingleses. E usou de uma parábola sobre um homem que vivia do arrendamento de suas terras. Ao fim do arrendamento, esse homem recebeu de volta sua propriedade totalmente estéril, e não teve mais como se manter. Enquanto isso, O Paraopebano defendia que o valor pago pelos ingleses era compensador ao país.

O surgimento de jornais que defendiam o absolutismo também foi criticado pelo Universal. Essas novas publicações eram acusadas de “revolucionárias” (palavra utilizada com o sentido de reacionárias).

O Universal, que em seus primeiros anos elogiou o imperador, mudou de posição e deu uma importante contribuição para a abdicação de D. Pedro I, de acordo com Costa Filho (1955). No entanto, até o final do primeiro reinado, a publicação concentrava suas críticas aos ministros e aliados do imperador, buscando sempre isentar de culpa D. Pedro I.  Jornais de situação, nas Gerais, como O Telegrapho (circulou de 1828 a 1831), respondiam a suas críticas. Por causa dessa disputa, “telegráfico” passou a ser uma expressão utilizada pelo Universal como sinônimo de absolutista.

Mas, nesse período, apesar de ficar do lado dos liberais, o periódico mostrou posturas conservadoras. Em 3 de junho de 1829, ele elogia o Conselho Geral da Província por ter pedido a prorrogação do tráfico negreiro por mais seis meses.

Em 11 de fevereiro, na edição nº 556, pouco menos de dois meses da abdicação, o jornal trouxe ataques bem mais violentos.

 

“(...) acusa os absolutistas ou telegráficos de falar em cortar cabeças. Empregando uma linguagem talvez jamais empregada em seus artigos, notícias ou notas, o redator acusou os telegráficos de cativos, hipócritas, intrigantes, mentirosos, ladrões, ignorantes, egoístas e matadores” (Costa Filho, 1955, p. 38).

 

            Quando da visita do imperador, pouco antes de sua abdicação, o periódico teve uma postura de muito respeito a ele. No entanto, em 22 de abril (15 dias após a abdicação), o jornal critica D. Pedro I, chamando-o de ingrato, e acusando-o de trazer a escravidão e a tirania. Com relação à abdicação, o Universal diz ser a revolução “mais importante e gloriosa de quantas se tem feito no mundo” (apud Costa Filho, 1955, p. 39).

O jornal circulou até a véspera da Revolução de 1842, quando seu proprietário fechou o periódico e usou seus tipos para serem derretidos e transformados em munição para os rebeldes. Esse é um dos fatos mais radicais do jornalismo brasileiro, o que contrasta bastante com a moderação da imprensa mineira.

Em 1825, surgiram outros três jornais, de menor importância, em Ouro Preto: O Companheiro do Conselho, O Diário do Conselho do Governo da Província de Minas e O Patriota Mineiro. Costa Filho (1955) mostra que o Diário do Conselho também protestou muito contra as concessões feitas para estrangeiros, não só na mineração, como na indústria e na navegação. O jornal dizia:

 

“(...) ao trono imperial com os gemidos de um povo agrícola, e mineiro, que imploram a clemência soberana. Sobrecarregado o povo de antigos impostos, e subsídios duplicados modernamente não receia poder subsistir, e que sua particular indústria, e propriedade sejam enormemente lesadas com tantas Companhias Estrangeiras, que começam a entrar nas Minas e pretendem apossar-se das chaves, e navegação do Rio Doce com o monopólio, e extração diamantina nesta, e províncias anexas, e aonde quer que forem denunciados...” (apud Costa Filho, 1995, pp. 32 e 33)

  

O próximo jornal que surgiu nas Minas, em 20 de novembro de 1827, em São João Del Rei, foi o Astro de Minas, considerado “brilhante”, pelo jornalista e historiador Xavier da Veiga (1898). Foi a primeira publicação criada fora de Ouro Preto. Ela era impressa em uma oficina própria e tinha formato e diagramação semelhantes aos seus antecessores. Quando surgiu circulava apenas um jornal nas Minas, o Universal.

O Astro de Minas seguia a mesma linha do Universal, ou seja, era liberal moderado. Ele tratava Bernardo Vasconcelos, o principal redator do Universal, como o “ídolo dos mineiros”, que era uma forma usual de chamar este líder político pelos seus partidários.

Apesar de liberal, o Astro era defensor da escravidão. Por isso, fez fortes críticas a Gazeta do Brasil, que era abolicionista. O jornal mineiro disse: “Não quer, a gazeta, o comércio de escravos da costa da África, mas quer o cativeiro dos brasileiros” (apud Costa Filho, 1955, p. 40).

Mas o Astro fez críticas a muitos políticos, inclusive aos Andradas, acusando-os de cometer excessos no poder. Também foi defensor da monarquia constitucional e de outras idéias liberais.

O Arraial do Tijuco (hoje, a cidade de Diamantina) foi o terceiro lugar ter jornal na província, o Echo do Serro, em 1828. No mesmo ano, foram criadas três publicações em Ouro Preto: Actas das Sessões do Conselho do Governo da Província de Minas-Geraes, O Precursor das Eleições e O Telegrapho.

Dos jornais criados em 1828, três destacam. O Echo, que também seguia a linha liberal, e era crítico ao imperador. O Telégrafo (1828-1839) que, como já se falou anteriormente, era conservador, e iria polemizar com os jornais liberais. E surgia o primeiro jornal apartidário da província: O Precursor das Eleições.

Esse limitava-se a recomendar candidatos para a Assembléia Geral Legislativa e para o Conselho Geral da Província. Foi criticado pelo Universal. No entanto, paradoxalmente, em sua 2ª edição, o Precursor das Eleições apontou como o primeiro nome da lista de candidatos sugeridos, o de Bernardo Vasconcelos, o principal redator do Universal. Circularam apenas três edições do Precursor, que é considerado pelo Vianna (1945) como o primeiro jornal político do Brasil.

Em 1829, em Ouro Preto apareceu O Novo Argos; e, em São João Del Rei, O Amigo Verdade. Essas duas publicações tiveram muita importância. O Novo Argos (1829-1834), de postura liberal, vinha se juntar ao Universal na crítica ao governo vigente. Já O Amigo da Verdade (1829-1830) vinha unir forças com o Telegrapho, na defesa dos conservadores.

O Novo Argos é muito elogiado por Costa Filho (1855). Seu diretor era o culto e combativo padre Antônio José Ribeiro Bhering, considerado por Costa Filho (1855, pp. 43 e 44) “uma das pessoas mais interessantes daquela época, em Minas (...) um dos mais pugnazes da hora”. O jornal foi o primeiro das Gerais a trazer impresso o nome de seu proprietário e redator. Como era característica dos periódicos mineiros, era polido e sabia fazer críticas fortes de forma prudente. A figura do líder liberal Bernardo Vasconcelos era exaltada pelo periódico, que o chamava de “ídolo dos mineiros, defensor da liberdade brasílica”. É interessante observar que nas Minas os jornais conservadores, chamados de “corcundas”, eram acusados de utilizarem uma linguagem inconveniente, ou seja, muito agressiva.

A partir de 1830, a imprensa se espalhou por outras regiões. Em Mariana foi criado a Estrella Mariannense; no Serro, o Sentinela do Serro (este tendo como redator o liberal Teófilo Otoni); em Pouso Alegre, O Pregoeiro Constitucional. Ouro Preto ganhou duas publicações: o Semanário Mercantil e o Mentor dos Brazileiros. Em São João Del Rei foi criado o Constitucional em Triumpho, considerado um campeão do jornalismo liberal, por Costa Filho (1955). Em 1830, de acordo com Costa Filho (1955), as Minas tinham oito jornais, sendo seis liberais, e dois conservadores.

Em 1832, Campanha, Caeté e Sabará também ganharam jornais. O Novo Argos já havia questionado por que ainda não tinham sido criados jornais em Sabará, dizia “Gemem os povos de Sabará (...) Quando virá a tão esperada tipografia”. Em 1836, Barbacena teve sua primeira publicação (O Parahybuna), e em 1840, Tiradentes (O Popular).

Foi na década de 1830 que o jornal começou a se consolidar nas Minas Gerais. Com o surgimento de mais publicações, e com a interiorização da imprensa esta passou a ganhar importância na província. No entanto, em várias províncias os jornais surgiram com força assim que se tornou livre a criação de publicações, em 1821. E, mesmo antes disso, houve a implantação de alguns jornais em capitanias do Brasil.

De 1830 até 1897 (quando termina o inventário de Xavier da Veiga) foram criadas centenas de publicações, em 87 cidades mineiras. O grande centro do jornalismo das Gerais no século XIX foi Ouro Preto, a capital da província (depois estado) até o final de 1897. Lá surgiram 163 periódicos.

Depois aparece Uberaba, com 57 publicações, e Juiz de Fora, com 55. O interessante é que estas duas cidades são mais recentes, e não faziam parte do circuito do ouro. Por isso, a imprensa apareceu nesses locais nas últimas décadas do século XIX, e, consolidou-se rapidamente. Em Juiz de Fora, o primeiro jornal foi O Imparcial, criado em 1870; e, em Uberaba, o precursor foi O Paranahyba, de 1874.

Isso mostra que a imprensa vai acompanhando o movimento da população mineira, que migra da região mineiradora para outros locais. Os jornais que, na primeira metade do século XIX, vão se concentrar em cidades como Ouro Preto, São João Del Rei, Sabará, Mariana, Serro e Diamantina, no final do século XIX, passam a se concentrar em regiões como o Triângulo Mineiro, a Zona da Mata e, na nova capital, Belo Horizonte (que é criada em 12 de dezembro de 1897, com o nome Cidade de Minas).

São João Del Rei e Diamantina tiveram grande importância no jornalismo oitocentista, a primeira cidade com 41 publicações (até 1897) e a segunda com 45. Além disso, surgiram muitos jornais em cidades próximas, como o Serro (10 periódicos), perto de Diamantina; e Tiradentes (4 periódicos), muito próximo de São João Del Rei.

No sul das Minas, destacou-se a cidade de Campanha, que teve 33 periódicos (até 1897), a grande maioria na segunda metade do século XIX. Mas a imprensa se alastrou por todas as regiões da Província (depois Estado). De acordo com o inventário de Xavier da Veiga (1898), foram criados 867 periódicos nas Gerais, de 1823 a 1897, o que corresponde a uma média de 11, 77 novas publicações por ano.

 

1.4.2 Mulheres jornalistas

 

            A mulheres são responsáveis por duas experiências importantes de jornalismo nas Gerais. É provável que na Província tenham surgido os primeiros jornalistas de saias do Brasil.

            Em 30 de novembro de 1829, em São João Del Rei, foi criado o Mentor das Brasileiras, um jornal feito por mulheres, com orientação política liberal, tratando de política, literatura e educação. A publicação também defendia uma maior participação feminina na vida pública.

            O jornal fez duras críticas a D. Pedro I, e chegou a defender o uso de armas em edições próximas a data da abdicação do imperador. “Minas não cede a qualquer outra em amor pela Liberdade; os mineiros estão dispostos a derramar a última gota de sangue por este objeto” (apud Costa Filho, 1955, p. 48).

            Outro jornal mineiro produzido por mulheres, no período oitocentistas, foi o Sexo Feminino, de Campanha. Ele durou exatamente um ano, de 7 de setembro de 1873 a 7 de setembro de 1874. Era um jornal engajado na defesa feminina, reivindicando, por exemplo, a instrução das mulheres. Em sua 1ª edição dizia: “Em vez dos pais de família mandarem ensinar suas filhas a coser, engomar, cozinhar, varrer a casa, etc, etc, mandem-lhes ensinar a ler, escrever, contar, gramática da língua nacional perfeitamente, e depois economia, medicina doméstica...” O Sexo Feminino era redigido pela professora primária Francisca Senhorinha da Mota Diniz e suas filhas.

 

1.4.3 Periódicos literários

 

            As publicações literárias eram muito comum no período oitocentista. Os jornais seguiam a linha política ou literária. Nas Minas, o grande jornal literário do século XIX, na opinião de Campos (1922) foi o Cysne, que surgiu em 15 de novembro de 1895. Ele tinha um corpo de colaboradores composto pelos principais escritores e intelectuais do Estado. Entre seus fundadores estava Arthur Bernardes, que algumas décadas depois chegaria a presidência da república.

            Campos (1922) erra ao dizer que a primeira publicação literária das Gerais foi a Academia Mineira, fundada em 1853, em Ouro Preto. Ibrahim Drummond (2001) apresenta publicações literárias bem mais antigas. Diz que o primeiro periódico literário da Província foi o Atheneo Popular, de 1843; e que, em 1º de janeiro de 1845, surgiu o Recreador Mineiro, que circulou até 15 de junho de 1848. O jornal tinha um formato pequeno, 14 X 20 cm, e periodicidade quinzenal.

Campos (1922) inventaria os periódicos literários que surgiram na região no século XIX. No entanto, é provável que o autor tenha deixado de citar alguns periódicos literários:

  • Ouro Preto: Mosaico Ouropretano, 1876; Recreador Mineiro, 1878; Ensaios, 1890; O Porvir e O Trabalho, 1892.
  • Santa Bárbara: Recompilador Mineiro, 1872.
  • São João Del Rei: O Domingo, 1885; A Alvorada, 1886.
  • Barbacena: O Bandolim, 1890; O Mensal, 1891.
  • Uberaba: O Recreio, 1880; A Moça, 1891; A Revista, 1893; O Jasmim, 1896.
  • Baependi: A Evolução, 1890.
  • Pitangui: A Alvorada, 1892.
  • Itapecerica: Recreador Mineiro, 1887.
  • Lavras: A Flôr, 1887.
  • Oliveira: A Borboleta, 1890, e A Bonina, 1891.

 

Ibrahim Drummond (2001) ressalta que nos jornais políticos também havia espaço para o entretenimento e textos que se aproximam mais do jornalismo cultural (isto geralmente vinha na última página), que tinha como função formar leitores, ou seja, estimular o hábito da leitura de periódicos.

 

“Entretanto, deve-se prestar atenção à última página desses jornais de fundo político. Nela é que esse leitor abstrato começa a se tornar visível através de um tipo especial de texto. São os comunicados gerais, avisos, anúncios de coisas do cotidiano e as correspondências aí publicadas. Tais matérias foram ampliando sua temática até abranger crítica de acontecimentos culturais - teatro, festas públicas, solenidades religiosas - que também assumirá, num e noutro jornal, o caráter incipiente de crítica literária. Além desses textos, a página quatro publicava certas curiosidades, como adivinhações, epigramas, enigmas, charadas e logogrifos, conteúdos do discurso muito fértil à época pelo Brasil afora. Eles se destinavam a entreter o leitor e cativar sua adesão à leitura; funcionaram também como rudimentar, mas precioso, exercício intelectual. São conteúdos de livros populares como o Lunário Perpétuo, que circulou entre nós desde 1703, e de almanaques, de longa tradição na Europa e que, no século XIX, ganhavam o público brasileiro com as edições locais. Em Ouro Preto, encontrei o registro de almanaque curioso, editado anualmente a partir de 1830: eram as folhinhas de algibeira, livro de bolso contendo calendário e orientações gerais sobre as estações do ano, clima, festas religiosas e civis e - detalhe importante – secções de curiosidades e instruções práticas.”

 

            Ibrahim Drummond (2001) mostra que as publicações literárias eram bem recebidas pelo público mineiro, e cita como exemplo uma das pioneiras, o Recreador Mineiro. Com apenas um ano de circulação, ele já possuía 723 assinantes, em Minas, Rio de Janeiro, São Paulo, Espírito Santo, Lisboa e Paris, isto sem contar as vendas avulsas. Quanto ao conteúdo, de acordo com Ibrahim Drummond (2001) “o Recreador Mineiro se convencia da importância de não apenas tratar de literatura e das ciências, como também [das] regiões do jocoserio e da hilaridade”.

 

1.4.4 Imprensa republicana

 

            A análise feita por Guerra Andrade; Hanriot (1990) sobre os jornais republicanos na Gerais, no período de 1869-1889, mostra que boa parte da imprensa da Província apoio o movimento anti-monarquia. Dos 75 jornais que circularam no período estudado, 40 eram politicamente neutros, 12 liberais, 11 conservadores e 12 republicanos.

            As autoras ressaltam que uma característica dos jornais republicanos era comemorar o 21 de abril (Inconfidência Mineira), enquanto os conservadores preferiam valorizar o 7 de setembro (Independência). Por isso, um jornal conservador adotou o nome 7 de setembro, apontando D. Pedro I como herói da Independência. Em resposta, os republicanos criaram uma publicação chamada 7 de Abril, em referência a abdicação do imperador.

            Entres as 12 publicações republicanas, três se destacavam: O Jequitinhonha (Diamantina, região Norte), Colombo (Campanha, localizada no Sul) e Movimento (Ouro Preto, no Centro da Província).

            O Jequitinhonha, que circulou de 1860 a 1873, em seus dez primeiros anos de vida seguia a linha política liberal. Somente após 1871, um mês depois do Manifesto Republicano, no Rio de Janeiro, o jornal passou a defender a república. Seus diretores são Joaquim Felício dos Santos (que se destaca nas Minas como historiador) e seu sobrinho Antônio Felício dos Santos.

            O jornal tem tom polêmico e sarcástico. Na publicação, destaca-se a coluna Páginas da história do Brasil, escritas no ano de 2.000. Nela Joaquim Felício fazia críticas a monarquia através de um diálogo fictício entre um visconde e o imperador, que se passava no fim do segundo milênio. A coluna era semanal e terminou poucos antes do fechamento do Jequitinhonha.

            O Colombo, que foi publicado de 1873 a 1875, em Campanha, no Sul das Minas, também ocupou uma posição de destaque na luta republicana. A figura de maior destaque no jornal era o poeta e jornalista Lúcio Menezes Furtado de Mendonça, que, apesar de fluminense, morava na cidade mineira. Ele era uma personalidade muito respeitada no país, tendo sido um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras. No Colombo, ele escreve artigos críticos a monarquia, mas também publica poemas, muitos com temas sociais, como: “Para as vítimas da seca do Nordeste” e “A revolução”.

            O Partido Republicano do Sul das Minas era representado pelo periódico, que não aceitava acordo com os liberais. É interessante e louvável que o jornal não aceitava a publicação de anúncios sobre escravos, sendo coerente com suas idéias abolicionistas.

            Ele parou de circular, entre 1875 e 1877, por dificuldades financeiras. Mas, em 1878, voltou em um formato maior, e com uma maior ligação com o jornal A República, do Rio de Janeiro.

            O primeiro órgão oficial do Partido Republicano Mineiro, O Movimento, surgiu em 23 de janeiro de 1889, em Ouro Preto, pouco mais de seis meses após a criação do partido (que ocorreu em 4 de junho de 1888). Seu redator-chefe foi João Pinheiro da Silva, advogado e industrial, e a principal liderança republicana das Gerais.

            O jornal foi muito bem recebido, e já nos seus primeiros anos de vida chegou a uma tiragem de 5 mil exemplares. O periódico tem muita ligação com os republicanos carioca, e tem como seu principal correspondente no Rio de Janeiro, Aristides de Araújo Maia.

            A valorização dos operários era um diferencial importante do Movimento:

 

“(...) a idéia social republicana é a idéia de emancipação dos proletários, tanto pelos acorrentados pelas algemas da ignorância, quanto das vítimas das desigualdades sociais e políticas. Difundir o ensino sob os auspícios da mais absoluta liberdade tanto científica quanto administrativa, desenvolver pela aprendizagem o nível igualitário dos cidadãos, são exemplos dos fins do regime republicano” (apud Moura et al, 1990, p. 144).

 

1.4.5 Imprensa em Belo Horizonte

 

            A nova capital mineira nasce mostrando que seria o grande centro do jornalismo do Estado. Antes mesmo de ser inaugurada, em 12 de dezembro de 1897, cinco publicações já havia sido criadas no local: Bello Horizonte (7 de setembro de 1895), A Capital (28 de janeiro de 1896), Aurora (15 de novembro de 1896), Tiradentes (21 de abril de 1897) e Bohemio (4 de julho de 1897).

            Linhares (1903) mostra que em 1902, apenas quatro anos após a fundação da capital, já havia surgido na cidade 41 jornais e 8 revistas. Em 1900, havia circulado 14 jornais, e três revistas. Alguns periódicos, como o Minas Gerais (órgão oficial do Estado, que circula até hoje), já existiam, só mudaram sua sede da antiga capital Ouro Preto, para Belo Horizonte.

            O primeiro jornal (Bello Horizonte) era católico, e foi fundado pelo padre Francisco Martins Dias. Essa publicação, a partir de 30 de setembro de 1898, mudou de redator e de linha editorial, deixando sua ligação eclesial. O jornal circulou semanalmente por 3 anos e meio, e, diariamente, por 6 meses. Sua tiragem, nos primeiros anos era de 600 a 700 exemplares, que depois foi ampliada para 1.000.

            O segundo jornal de Belo Horizonte foi A Capital (28 de janeiro de 1896 a 4 de agosto de 1898), que circulava duas vezes por semana, com tiragem de mil exemplares. Depois surgiu o Aurora (15 de novembro de 1896 a 1º de agosto 1897), um jornal literário, quinzenal, com tiragem de 300 exemplares. O quarto periódico chamava Tiradentes, por causa da data de sua fundação (21 de abril de 1897), mas foram feitas apenas três edições do jornal. A quinta publicação da capital foi o Bohemio (4 de julho de 1897 a 22 de agosto de 1897), um jornal humorístico.  Todos esses periódicos surgiram antes da inauguração da nova capital, que inicialmente chamava Cidade de Minas.

            Linhares (1903) mostra que surgiram periódicos de todas os tipos, até1902, na nova capital.

Jornais religiosos: Bello Horizonte (1895) e Tribuna Católica (1900).

Jornais de propaganda: A Flôr (1900), A Propaganda (1901), O Norte (1901) e A Capital (1900) – Obs: houve dois jornais com o nome A Capital, um em 1896 e outro em 1900.

Jornais literários (foram 20 periódicos). Os principais: Aurora (1896), Tela (1898), Lótus (1900), A Violeta (1900) e o Helianto (?).

Jornais humorísticos: Bohemio (1897), A Urtiga (1899), O Prego (1902) e A Coisa (1902).

Jornal jurídico: Academia (1898).

Jornal oficial: Minas Geraes (1898).

Jornais políticos: Diário de Minas (1899) e Jornal do Povo (1899).

Jornal proletário: O Operário (1900).

Jornal da Maçonaria: A Reforma (1901).

Jornal dos comerciantes: O Commercio de Minas (1901).

Jornal ilustrado: O Sal (1901).

            As revistas, que surgiram em Belo Horizonte, até 1902, podem ser classificadas como: jurídicas (duas publicações), científica (uma), comemorativa (uma), literárias (três) e histórica (uma). Somente as três revistas literárias foram criadas na nova capital, as outras cinco só transferiram suas sedes, que antes ficavam em Ouro Preto. A principal revista é a do Arquivo Público Mineiro, que é uma das principais fontes, até hoje, para o estudo das Minas Gerais.

 

BIBLIOGRAFIA

 

BRAGANÇA, Aníbal. Uma introdução à história editorial brasileira. Lisboa: Universidade Nova de Lisboa, Centro de História da Cultura, 2002. 57-83 pp.

 

CAMPOS, Sandoval; LOBO, Amynthas. Imprensa Mineira: Memória histórica – Edição comemorativa do centenário da independência (1822-1922). Belo Horizonte: Typ. Oliveira, Costa & Comp., 1922. 169 pp.

CARVALHO, André & BARBOSA, Waldemar. Dicionário Biográfico Imprensa Mineira. Belo Horizonte: Armazém de Idéias, 1994. 259 pp.

 

COSTA FILHO, Miguel. A imprensa mineira no Primeiro Reinado. Tese apresentada ao VI Congresso Nacional de Jornalistas. Rio de Janeiro: 1955, ed. não identificada. 62 pp.

 

CUNHA, Lygya da Fonseca Fernandes da. Uma raridade bibliográfica: O canto encomiástico de Diogo Pereira Vasconcelos impresso pelo padre José Joaquim Viegas de Menezes, 1806. Rio de Janeiro: Biblioteca Nacional, 1986. 69 pp.

 

DRUMMOND, M. Francelina Silami Ibrahim. Instrução e recreio do leitor: de variedades à literatura. In: Anais do V Congresso de Ciências Humanas, Letras e Artes. UFOP. 2001.

 

LIMA JÚNIOR, Augusto. A Capitania das Minas Gerais. Belo Horizonte: Itatiaia,

 

LINHARES, Joaquim Nabuco de. Imprensa em Belo Horizonte. In: Revista do Arquivo Público Mineiro, ano VIII, 1903, pp. 585-614.

 

MACHADO, Abílio. História da imprensa mineira. Jun. 1929. O Jornal (edição especial). Rio de Janeiro.

 

MELO, José Marques de. Sociologia da imprensa brasileira. Petrópolis: Vozes, 1973. 163 pp.

 

_____. História social da imprensa. Porto Alegre: Edipucrs, 2003. 2ª ed. 184 pp.

 

MENDES, Jairo Faria. Xavier da Veiga: O precursor nos estudos sobre jornalismo nas Minas Gerais. Jornal da Rede Alçar. Ano 4, nº 44, 1º de agosto de 2004.

 

_____. Padre Viegas, ártifice da primeira tipografia brasileira. Jornal da Rede Alçar. Ano 4, nº 45, 13 de setembro de 2004.

 

MOURA, Antônio de P. e outros. O debate e a propaganda republicana na imprensa mineira - 1869/89. In: Revista do Arquivo Público Mineiro, ano XXXVIII, 1990, pp. 131-257.

 

NUNES, Maria de Fátima e BRIGOLA, João Carlos. José Mariano da Conceição Veloso (1742-1811). In: Casa Literária do Arco do Cego (1799-1801). Lisboa: Imprensa Nacional – Casa da Moeda, 1999.

 

PASSOS, Alexandre. A imprensa no período colonial. Rio de Janeiro: Ministério da Educação e Saúde, 1952. 72 pp.

 

REIS, Liana Maria. Escravos e abolicionismo na imprensa mineira (1850/1888). Dissertação de Mestrado em História. UFMG. 1993. 216 pp.

 

RIZZINI, Carlos. O jornalismo antes da tipografia. São Paulo: Companhia Editorial Nacional, 1968. 204 pp.

 

ROMANCINI, Richard. Inventando tradições: Os historiadores e a pesquisa inicial sobre o jornalismo. Anais do II Encontro da Rede Alçar. Florianópolis, 15 a 17 de abril de 2004. GT História do Jornalismo.

 

SODRÉ, Nelson Werneck. História da imprensa no Brasil. Rio de Janeiro: Mauad, 1999. 4ª ed. 501 pp.

 

TÔRRES, João Camilo de Oliveira. História de Minas Gerais. Vols. 2, 3 e 4. Belo Horizonte: Difusão Pan-Americana do Livro. 2ª ed.



[1] Provavelmente o Dictionnaire des Sciences, des Arts et de Métiers (1751-1777), de Diderot.