Nas Ruas

15-03-2011 23:24

Quem diria que a Diamantina moderna, que se tornou esportista e equlibrista, chegaria a um dia, a ter esse movimento colosso nas ruas, principalmente, aos domingos, á noite?!

            Apesar do tempo, úmido e chuvoso, o footing permanece com animação, extendendo-se da rua Campos de Carvalho ás imediações amorosas do prédio Bizorreta, onde os galos cantam, mas os pobres pais não ouvem...

            Ah! Se as pedras falassem, quando coisa interessante se apanharia nesse vai-vem noturno!

            Chico Olímpio, vai muito bem substituíndo o João Tampinha, que já chegou a Rio Branco, capital do Acre, havendo viajado em avião, do Rio áquela feracíssima região das seringais.

            Foi a negócio de borracha, e de borracha, com efeito, estamos carecendo nós, para recolocar os bons costumes em seus lugares.

            Chico Olímpio é filósofo e conhece bem matemática.

            Já observou aqui uma esquisita equação entre duas quantidades heterogêneas...

            Luta-se com um descarado gavionamento que a moral social repele.

            São muitas as justinas desobedientes pelo salitroso assanhamento, com que se rebaixam, dando confiança a mequetrefes lagartixas que não enxergam o seu lugar.

            Chegou a temporada satânica do aviltamento moral, e os corruptores das filhas alheias precisam ser castigados e afastados do convívio honesto de uma sociedade onde se cultiva ainda o lírio do val e as flores perfumosas da água de flor da larangeira.

            O escândalo que se reproduz em plenas praças da cidade, porque a vergonha barateou demais, já se repete, a miúde, em nossas ruas e vielas, como se fosse a coisa mais natural deste mundo.

            Ainda há pouco que se deu, atrás da Catedral?

            Pai Elias foi buscar a filha ,

            Na Capistrana do Macau:

            Mas, quem diria que o pai da Fina,

            Apanhasse dum bate-pau?...

            A desenvoltura pela imprudência reclama nas ruas um dique de cimento armado...

            A coisa, gente, não está de toda podre e perdida, não, valha nos Deus!

            Chico Olímpio ouviu lá na rua do Meio este diálogo, interessante, entre uma empregadinha e uma tia velha, aliás bem confortador:

            - Tia Geralda, eu não vou nisso; esse bailes do Arraial de Baixo, Morro do Capeta, Samambaia, Arraial dos Forros, Rio Grande, Palha e Alto da Poeira, dão sempre pau, ginástica, facada e tio de pólvora... Curúz, Ave-Maria! – Vai pensando sempre assim, filhinha, o carrapicho tá brabbo, e S. Zita não está satisfeita , não! Chora, coitada, toda noite!...

            Oleré, Novo bacaret, S/A!...

            - Onde é Germana?

            - No Beco do Alecrim, verde, roseo e cheiroso; doce como açúcar rafinado!...

            - E os urubus?

            - Contra eles, só responso com cinco velas de cabeça prá baixo, sem pingar cera, no soaio, dirigido a S. Rita, advogada dos impossíveis!...

            E as famias?

            - Elas só ajoeiando nos pés do véio Taumaturgo, valente e sagás no pau; só ele poderá acabar com a patifaria!...

            O dia 6 dos Santos Reis esteve sem chuva, mas com calor e quente demais!...

            - No Alto da Poeira, á noite, mesmo com chuva, levantou poeira que fura e doe...

            Na Serra do Rio Grande, as coisas amarelaram de verdade, com bordoadas de violão, mas felizmente sem sangue frio...

            Não deixa de ter razão a velha costureira do Beco das Caveiras:

            - Moça, quietaa na sua casa, vai ler coisa boa e livrode santo. Quem tá na igreja, rezando, não sofre, não chora, nem vai esparrar no Hotel Aliança...

            Vejam só: o consumo da cachaça aumentou! Grande coisa! Diz Chico Olímpio: pois até os carros não andam embriagados?...

            Será verdade que a grade do amor vai ganhar uma cancela com cadeado?...

            Lemos algures que S. Bernardo pregou que a medida do amor é amar sem medida.

            Assim, pois, todos os jovens de ambas rapaduras, devotados a Cupido são naturalmente propensos a adotar a legenda do grande doutor da Igreja, mas cumpre não esquecer que a expressão “sem medida” não que dizer sem guardar as conveniências, o decoro público.

                        Os namorados das ruas devem respeitar e não dar escândalos como se fossem quase... pombinhos no telhado...

XX. Voz de Diamantina, E’cos das Ruas, 1943.