Padre Belchior e D. Pedro I

11-09-2012 19:03

Comemora-se a 8 de dezembro de 2004, duzentos e vinte nove anos do nascimento de Padre Belchior Pinheiro de Oliveira, diamantinense dos mais ilustres, com participação destacada na Independência do Brasil.

            Filho de Belchior Pinheiro de Oliveira  e D. Floriana Rosa de Oliveira, nasceu no Arraial do Tejuco, quando florescia a indústria extrativa  e a opressão portuguesa se fazia sentir, através do despótico e tirânico código do Regimento Diamantino, conhecido popularmente como o Livro da Capa Verde, e que veio substiruir o regime dos contratos.

            O serviço de extração ficava subordinado a uma junta administrativa, composta de um intendente e três caixas.

            Os soldados do destacamento dos Dragões ou pedestres, por esse regimem, deviam dar buscas em qualque casa ou pessoa, sobre a qual recaísse a mínima suspeita de traficância, prendendo-o sumariamente, e até deportando-o.

            O exercício da advocacia foi proibido, não podendo os bacharéis em direito residir no Distrito Diamantino, salvo sob o compromisso de não exercerem a profissão.

            Chegou ao cúmulo de conferir ao Intendente, a faculdade de aplicar a pena de morte a qualquer indíviduo, sem apelação nem recurso de qualquer espécie.

            Essa de um modo geral, a lei; imaginemos os abusos da própria lei. Pois foi nessa atmosfera de horror, apróbio e tirania que reinava no Tejuco, que nasceu Belchior Pinheiro de Oliveira, nos idos de 1775, no dia consagrado á Imaculada Conceição.

            Por presenciar, na infância, a situação desoladora dos seus patrícios, o sofrimento d’aquela gente laboriosa e ordeira, por ver grassar tanta injustiça, cresceu em seu espírito o sentimento de revolta contra o lusitanismo, fazendo-o extremo defensor da libertação do Brasil.

            Como sacerdote católico desenvolveu raro apostolado, deixando marcada a sua presença, principalmente na paróquia de Pitangui, onde exerceu por muito tempo o cargo de Vigário, por apresentação Régia, vaga com a morte do Padre Domingos Soares Torres Brandão.

            Fez seus estudos religiosos no Seminário de Mariana, ordenando-se em São Paulo, a 21 de dezembro de 1798, seguindo posteriormente para Coimbra, onde se bacharelou em Cânones e estudou direito civil.

            “O meio desolador e profundamente amargurante em que nasceu e onde passou sua infância de mocidade; os sofrimentos a qua assistiram de seus patrícios, tão duramente espezinhados pelo despótico governo da Metrópole Portuguesa, certo deviam influir fundamente, como influíram no seu espírito brasileiro, para torna-lo dentro em pouco o ardentee nacionalista que efetivamente foi”.

            Já em 1812, vamos encontra-lo, juntamente com José Joaquim de Alburquerque Cavalcante, Luiz Pereira de Nóbrega e outros, pugnando pela libertação da pátria, movimento que cresceu com a vinda da Família Real portuguesa para o Brasil.

            Homem culto, doutor em direito e teologia, argusto e perpicaz, sua entrada na política foi determinada por seu decidido pendor, como demonstrou posteriormente.

            Numa consagração do prestígio que grangeou entre os seus conterrâneos, em Setembro de 1821, era escolhido deputado por Minas Gerais ás Cortes de Lisboa, não tomando posse entretanto devido ao acontecimento do “Fico”, quando revoltou-se patrioticamente contra os desmandos da Coroa em relação ao Brasil, induzindo inclusive, a todos os eleitos de Minas, a tomarem igual atitude, como protesto.

            Por diversas vezes teve oportunidade de manter diálogos com o Príncipe D. Pedro I, na casa do José Joaquim da Rocha, seu amigo inseparável, advindo daí, sua amizade com o monarca, de quem viria, em breve, se transformar em mentor espiritual e confidente.

            Durante o levante militar de Vila Rica, em março de 1822, acompanhou o príncipe aquela cidade, e, graças a seus conselhos e espírito de concórdia, foi conseguido o apaziguamento dos espíritos.

            Em agosto de 1822, quando de viagem do Imperador a São Paulo, foi o Padre Belchior incorporado á comitiva oficial.

            Nas margens do Ipiranga, descançavam Dom Pedro, o Pe. Belchior e o tenente Canto e Melo, quando são alcançados por Paulo Bregaro e Antonio Cordeiro, enviados pela princesa D. Leopoldina, com a correspondência chegada de Lisboa.

            Entre os papéis, encontrava-se o decreto das Cortes, que “cassava a Dom Pedro as prerrogativas de Regente autônomo e o rebaixou” á simples condição de delegado temporário e dependente  das Cortes, ao mesmo tempo que transferia para Lisboa, o governo do Brasil.

            Aberta a correspondência, não pode Dom Pedro conter a explosão de cólera que o dominou no momento, ao ouvir a leitura feita em voz alta pelo sacerdote.

            Virando-se para o Padre, pediu-lhe que o aconselhasse naquela emergência.

  • E agora, Padre Belchior?
  • Si Vossa Alteza  não se faz Rei do Brasil, neste momento, será prisioneiro das Cortes e deserdado por elas.

Não há outro caminho senão a independência e a separação.

            Dom Pedro caminha em silêncio alguns passos, voltou-se de repente e disse:

  • Padre Belchior, eles o querem, o terão a sua conta. As Cortes me perseguem chamam-me com despreso de “rapazinho e de brasileiro”.
  • Pois bem, verão quanto vale um “rapazinho”.

De hoje em diante estão quebradas as nossas relações; nada quero do Governo Português, proclamo o Brasil para sempre separado de Portugal.

Gritaram todos os presentes.

  • Viva a liberdade! Viva o Brasil! Viva Dom Pedro.

Diante de sua guarda disse o Príncipe: - Amigos, as Cortes Portuguesas querem escravizar-nos e persegue-nos. De hoje em diante nossas relação estão quebradas. Nenhum laço nos une mais.

            E, arrancando do chapéu o laço azul e branco, símbolo da Nação Portuguesa, atirou-o ao chão dizendo:

  • Laço fora, soldados! Viva a Independência, a liberdade e a separação do Brasil!

O Príncipe desembainhou a espada, no que foi seguido pelos militares; os paisanos tiraram o chapéu, e Dom Pedro disse:

  • Pelo meu sangue, pela minha honra, pelo meu Deus, juro fazer a liberdade do Brasil!
  • Juramos  - responderam todos.
  • Brasileiros! A nossa divisa de hoje em diante será – INDEPENDÊNCIA OU MORTE!

Não se pode desconhecer o papel de relevo do Padre Belchior no ato da proclamação, podendo-se afirmar que ele, inegavelmente, precipitou o brado histórico.

            E por muitos anos continuou prestando sua dedicação e serviços á causa brasileira.

Eleito representante por Minas á primeira Constituinte de 1823, aí se fez vigoroso defensor das liberdades pátrias, participando ativamente dos debates, principalmente quando o absolutismo começou a infiltrar-se nas coisas do Brasil.

Por conservar a fidelidade a José Bonifácio e Martim Francisco, quando da queda do Ministério Andrada, sustentando vigorosamente a oposição naquela Assembléia, foi preso e deportado, como outros patriarcas da Independência, todos eles amigos íntimos de Dom Pedro e que tudo fizeram para o colocar no poder e salvar a Pátria do despotismo.

Faleceu em Pitangui aos doze dias do mês de junho de 1856, aos 80 anos de idade.

Voz de Diamantina, Padre Belchior Pinheiro de Oliveira, David Ribeiro, pág. 3 e 4, ano LXX, nº 34, Dtna, 15 de junho de 1975.