Vários contos antigos
No ano de 1899, cogitava já na corte abolição dos escravos. Em Diamantina na mesma época chegava a Companhia Dramática Coimbra, era constituída por Antônio Coimbra, diretor; Herminia, sua esposa; Sofia, filha do casal, seu marido Luiz Bitencourt; Agostinho Pedro, secretário; Gustava Marcandier, cenógrafo; João Gonçalves Lessa e sua esposa Leodegaria. Possuíam um luxuoso e magnífico guarda roupa com várias fantasias e cenários que invejavam a outras companhias. Equipamentos e paranafernália para movimentar os truques nos palcos encantando a platéia e iludindo á cenas fantasiosas.
Permaneceram em Diamantina aproximadamente um ano, a Companhia Coimbra comparável com a famosa Companhia Boldrini e Correia que aqui estivera em 1888, representou várias encenações e repertórios de dramas, de óperas cômicas, comédias, duetos e operetas.
Uma das apresentações nos versos de Chiquita. Opereta de Chiquita-Mariquita, imitação da Ópera Giroflé-Girofla:
Flor de primor,
Eu sou Chiquita-Mariquita Fotos retirado do facebook
Que venho aqui saber
O que me vai acontecer
Com dois nos braços,
Com dois nos braços...
Com dois nos braços...
Não posso não, não posso não!
Não posso não!
Assim, o teatro animado, as pessoas frequentes admiravam os duetos, as operetas, as comédias que eram embalados ao coro do público.
O prédio do teatro de três andares, animava a sociedade diamantinense. Sendo em baixo, ficava o famoso "cinzeiro", onde os homens e mulheres alegres e boêmicos ou seja as meretrizes ficavam a espera dos divertimentos. No cinzeiro apelidado pelos homens da época, os bailes e a diversão era animadíssima. Em cima no salão onde acontecia as peças teatrais as damas e os cavaleiros mais comportados ficavam ali apreciando as apresentações, mais em cima os camarotes para as pessoas mais ilustres e poderosas da sociedade ficavam com sua família ou senhora apreciando a movimentação do salão e do palco onde arrolava o teatro. Na porta do teatro ficava o "Clube da Tesoura", um clube formado de homens que ficavam de plantão na porta para cortar as casacas dos ilustres cavaleiros. Brincadeira para muitos terminavam com suas casacas cortadas e ao lado num dos cômodos do teatro quase na saída para fora da rua ficava o bar. Eram contratrados os rapazes jovens para vender balas e outras guloseimas no salão do teatro.
Muito apaludido o Duo de los Paraguas (Dueto dos guarda-chuvas) dançado e cantado por Sofia Bitencourt e Agustinha Pedra.
Em 1890, o sábado de Aleluia caiu no dia 2 de abril. Estava o tempo pesado, era aproximação do inverno. Na Sé, as pessoas agasalhadas, ao meio dia, após as solenidades do encerramento da Semana Santa, foi realizado na rua da Quitanda a famosa queima do Judas. Ali a população misturda, aglomerada e esprimida para assistir o espetáculo. Foi estendido uma corda de uma janela a outra de um casarão em frente, prendia pelo pescoço o infeliz Judas Iscariotes, de máscara, cartola e fraque, botinas de verniz, dançando de acordo com as puxadas da corda e agitada por dois sujeitos; mais á ajuda do público presente que queria de qualquer forma sacudir o Judas. A banda de música do Corinho, sob a regência do maestro Paraguai (Antonio Efigenio de Souza) animava a galera com os duetos. Na sacada a disputa para apreciar o espetáculo de um ângulo melhor e ao mesmo tempo as moçinhas que eram puxadas para dentro, não podia se mostrar, os rapazes em baixo ficavam de olho nas donzelas em busca de um casamento com as lindas moças diamantinenses.
Em baixo, na rua, grande multidão de espectadores e sem falar na garotada e jovens que mais agitavam, gritavam e provocavam a diversas pessoas, principalmente aqueles que de uma forma ou outra eram políticos, comerciantes, banqueiros, etc.
- João Colchão!
- No lugar do Judas
- Cordolino!
- No lugar do Judas
- Juca Urso!
- No lugar do Judas
- Manoel Petelica!
Com certeza essas eram as pessoas da sociedade que desta época que incomodavam a sociedade, talvez, com o seu jeito nervoso, pão duro e outras maluquices. Fotos retirado do Facebook
Tudo isso entre os gritos estridentes e correrias da garotada que tentavam apanhar as moedas de cobre, o conhecido patacão, que eram atiradas das janelas. Potes de barro eram amarrados com enxame de maribondos (vespas) e os garotos eram vendados com uma fita de pano os seus olhos e nas suas mãos eram dadas um porrete para tentar quebrar o pote. A população gritava anciosa vai...; não, é mais para lá...; está quase!; Pronto quebrou o pote. Só via a multidão correndo por um lado e as vespas atrás irritadas partia para cima. Resultado vários pessoas picadas e com os rostos inchados. A banda do Corinho rufava os tambores e pratos agitando mais ainda a população.
Afinal acenderam um cigarro de polvora na boca do pobre judas, qua ainda dançando e sacudido, se incendiou, explodindo atiando pedaços de seus vestimentos por todos os lados. A cabeça de máscara de papelão mais a cartola voou no meio da multidão, rolando pela rua da Quitanda parando nos pés de um cidadão que estava próximo ao Beco da Tecla, dando um pulo de susto. A meninada aproveitou enfiava por debaixo das pessoas em busca da cabeça do Judas que acabou sendo uma disputa de bola nos pés da garotada. Os restos da rouparia ficou fumegando e espatifada no chão. Alguns mais fanáticos não conformado somente com a queima, ainda desceram pauladas nos restos fumegantes do judas ao grito de delírio da população.
Ainda algumas figuras permaneciam na tentativa de pegar os prêmios que ficavam no alto de um pau, ou seja do Pau de Sebo. Era fincado na rua um pau comprido todo emsebado e na ponta dele ficava algums prêmios como notas de dinheiro. Ali ficavam horas e horas tentando subir no pau emsebado. Várias tentativas escorregadias e derrapantes, os corpos ensebados davam um espetáculo dramático e engraçados nos tombos e na forma que se enrolavam. Depois de muitas tentativas, e o corpo fedido de sebo de tanto ilustrar o pau de sebo, alguém consegue arrancar a bandeira do mastro com as notas de dinheiro e sai correndo pelas ruas, aqueles que também participaram na tentativa correm atrás para pegar a sua parte. A população em gritos da algazarra riem sem parar das cenas que são protagonizadas.
Na noite, de sábado para domingo, os mais boêmicos e animados trovadores resolveram bater um castelo (serenata), com violão, flauta e cavaquinho, os alegres seresteiros: Emilio Leite, Odilon Queiroga, Zeca Mota, Julio Fonseca, Zeca Prado, Junius de Almeida, Joaquim Elias, Trajano, Carrinho Mota, acompanhando-os o barbeiro italiano Domingos d'Ascenzo.
Era costume percorrer diversas ruas da cidade, parando em frente ás casas de suas namoradas ou pretendidas, entoando as modinhas da época:
Bem sei, mulher, bem conheço
Que fui um louco em amar-te! Fotos retirada do Facebook
Dentro em meu peito já não sinto amor!
Penso em ti
Nestas horas de tristeza,
Quando o sol no acaso se conduz,
E o môcho solitário adeja e pousa
Nos braços carcomidos de uma cruz!
Quando começaram a cantar no Macau do Meio, em frente á casa do comerciante francês Alex Vial, que tinha uma filha, a Quita, era a favorita de um dos cantores e apaixonado por ela, a janela de cima abriu com toda força, aparecendo o negociante a gritar furioso:
- Seus vagabundos, é inútil essa cantoria! A preta cozinheira não está; dorme fora!
O Castelo prosseguiu ás ruas de Diamantina. A lua que iluminava as ruas escuras de Diamantina na madrugada fria de abril, pois os lampiões eram apagados mais cedo quando havia a iluminação lunar. Os cantores resolveram parar a sua cantoria retornando cada um para a sua casa.
O Odilon, filho do relojoeiro Antonio Augusto de Queiroga, era de estatura muito baixa, quase um anão. Andava namorando uma filha do negociante Salustiano Amancio da Rocha, delegado de policia, temido pela rapaziada, por sua cara de mau.
Num belo dia, passando Odilon pela porta do Salustiano, este o chamou:
- Senhor Odilon!
- O Rapaz aproximou-se, quase borrando nas calças de medo.
- Encoste aqui na parede.
O Odilon obedeceu.
O senhor Salustiano tirou do cavado colete um punhal. O pobre Odilon ficou pálido e tremida tanto que parecia que ía dar um tirapaco. Mediu na parede um palmo, acima da cabeça do rapaz, fez um risco com o punhal exclamando:
- Quando o senhor crescer e chegar a este ponto, pode vir pedir a minha filha em casamento.
Algum tempo depois faleceu de febre tifóide o pobre Odilon, amigo íntimo, inseparável do Emilio Leite, filho do Juca Leite (José Leite de Faria) e de D. cota, esta filha do Claudio Augusto Ribeiro de Almeida.
No dia do enterro do Odilon, a madrugada, o Emilio carregou seu colchão para o quarto de seus pais e o estendeu no chão, deitando-se. Ao ouvir o barulho, o Juca Leite acendeu a vela.
- Emilio, que é isto, meu filho? perguntou-lhe D. Cota - Está doente?
- Não senhora, respondeu ele.
- Ó mãe! agora é que vi que sou um patife!
O rapaz refugiara-se no quarto dos pais com medo de seu amigo Odilon lhe aparecer.
MEIRA, Erick Johan ns de, Voz de Diamantina, Tempos Idos, Ciro Arno, pág. 3, Diamantina, 1959.
Fotos retirada no Facebook